QR code on a market stall: Reuters/Alamy Stock Photo/Shailesh Andrade
QR code na banca de um mercado

Capítulo 10 Bancos, moeda e o mercado de crédito

Como o crédito, a moeda e os bancos ampliam as oportunidades de ganho mútuo, e os fatores que limitam sua capacidade de fazê-lo

  • As pessoas podem reorganizar o momento em que realizam seus gastos ao tomar empréstimos, emprestar, investir e poupar.
  • Ainda que as transações do mercado de crédito sejam motivadas por ganhos mútuos, há um conflito de interesse entre devedores e credores em relação à taxa de juros, ao uso prudente dos recursos emprestados e a sua devolução.
  • Emprestar e tomar empréstimos são ações que caracterizam uma relação principal-agente, na qual o credor (o principal) não pode assegurar o pagamento do empréstimo pelo devedor (o agente) por meio de um contrato executável.
  • Para resolver esse problema, os credores geralmente exigem que os devedores contribuam para um projeto com seus próprios recursos.
  • Como resultado, pessoas com patrimônio limitado às vezes não conseguem empréstimos, ou só os conseguem a altas taxas de juros.
  • A moeda é um meio de troca que consiste em notas, depósitos bancários ou qualquer outra coisa que possa ser usada para adquirir bens e serviços e que também seja aceita como pagamento pois outros podem usá-la com a mesma finalidade.
  • Os bancos são firmas maximizadoras de lucro que, ao longo do processo de oferta de crédito, criam dinheiro em forma de depósitos bancários.
  • O banco central de um país cria um tipo especial de moeda chamado moeda corrente, e o empresta aos bancos a uma taxa de juros determinada de acordo com sua política econômica.
  • A taxa de juros cobrada pelos bancos para tomadores de empréstimos (firmas e famílias) é, em grande parte, determinada pela taxa de juros determinada pela política econômica do banco central.

A cidade-mercado de Chambar, no sudeste do Paquistão, funciona como um centro financeiro para 2.400 agricultores das aldeias arredores. Em abril, no início da temporada de plantio de kharif, quando plantam algodão e outros cultivos comerciais, os agricultores compram fertilizantes e outros insumos. Meses já se passaram desde que venderam sua última colheita, e a única forma como podem comprar seus insumos é pedindo um empréstimo, com a promessa de pagamento na próxima colheita. Outros tomam empréstimos para pagar remédios e médicos. No entanto, poucos destes agricultores já passaram pelos vidros brilhantes e portas de aço do JS Bank na Hyderabad Road. Em vez disso, eles fazem uma visita a um dos cerca de 60 credores individuais que existem na cidade.

Se estiverem buscando um empréstimo pela primeira vez, serão muito questionados pelos financiadores, deverão fornecer referências de outros agricultores conhecidos do credor e, na maioria dos casos, receberão um pequeno empréstimo como teste de credibilidade. O potencial credor provavelmente fará uma visita para investigar as condições da terra, dos animais e dos equipamentos do agricultor.1

colateral
Ativo que o devedor oferece ao credor para assegurar a devolução de um empréstimo. Se o devedor não puder cumprir com os pagamentos como prometido, o credor passa a ser o dono daquele bem. Também conhecido como: garantia.

Os credores estão certos em serem cautelosos. Se a colheita fracassar por falta de dedicação do agricultor, seu credor perde dinheiro. Diferente de muitas instituições financeiras, os credores individuais geralmente não exigem que o agricultor reserve alguma propriedade ou bens (chamados de garantias) que se tornariam propriedade do credor se o agricultor não pudesse pagar o empréstimo — por exemplo, algumas joias de ouro.

Se o potencial devedor de primeira viagem parecer confiável ou honesto o suficiente, receberá um empréstimo. Em Chambar, sua taxa de juros média é de 78% ao ano. Se o devedor pagar o empréstimo em quatro meses (período de crescimento da safra antes da colheita), as 100 rúpias emprestadas antes do plantio se tornarão 126 rúpias a pagar. Sabendo que mais de metade das solicitações de empréstimo são recusadas, o devedor se consideraria um felizardo.

E de fato seria, pelo menos em comparação com algumas pessoas a 12.000 km de distância, em Nova York, que pegam empréstimos de curto prazo para pagar quando receberem seu próximo salário. A taxa de juros desses empréstimos consignados varia de 350% a 650% ao ano, muito acima da taxa de juros máxima permitida em Nova York (25%). Em 2014, o ”consórcio consignado” que oferecia esses empréstimos foi penalizado por usura criminosa de primeiro grau.2

Considerando essa taxa de juros, você acha provável que emprestar dinheiro em Chambar seja excepcionalmente lucrativo? As evidências sugerem que não. Alguns dos recursos emprestados aos agricultores são empréstimos tomados junto a bancos comerciais como o JS Bank a uma taxa de juros média de 32% ao ano, o que representa um custo para os credores individuais. E os custos da minuciosa triagem de solicitações e da cobrança das dívidas reduz ainda mais os lucros dos credores.

Em parte como resultado de escolhas cuidadosas feitas pelos credores individuais, a inadimplência é rara: menos de um em cada 30 devedores deixam de pagar os empréstimos. Por outro lado, a taxa de inadimplência de empréstimos concedidos por bancos comerciais é muito mais alta: um em cada três. O sucesso dos credores individuais em evitar a inadimplência baseia-se na sua avaliação precisa da capacidade de pagamento dos seus clientes.

Dinheiro e confiança estão mais relacionados do que você poderia imaginar.

Em 4 de maio de 1970, apareceu uma notícia no jornal Irish Independent, da República da Irlanda, com o título ‘Fechamento de Bancos’. Dizia assim:

Como resultado de ação coletiva promovida pela Associação dos Bancários Irlandeses … é com grande pesar que esses bancos se veem na obrigação de declarar o fechamento de todos os seus escritórios na República da Irlanda … a partir de 1 de maio, e até novo aviso.

Os bancos na Irlanda não abriram novamente até o dia 18 de novembro, seis meses e meio depois.

Você acha que a Irlanda caiu em um abismo financeiro? Para surpresa de todos, em vez de colapsar, a economia irlandesa continuou a crescer tanto quanto antes. Uma resposta de apenas duas palavras tem sido dada para explicar como isso foi possível: pubs irlandeses. O economista Andrew Graham visitou a Irlanda durante a greve de bancos e ficou fascinado com o que viu:

Como todos no vilarejo iam ao pub, e o dono do pub conhecia a todos, eles concordaram em aceitar pagamentos adiados em forma de cheques que não seriam liquidados pelos bancos num futuro próximo. Logo os pubs estavam permutando os pagamentos adiados de uma pessoa pelos de outra, transformando-se em intermediários financeiros. Porém, houve algumas decisões equivocadas e alguns pubs sofreram um golpe. Minha segunda experiência foi ter feito um pagamento com um cheque de um banco Inglês (£1 era igual a 1 libra irlandesa na época) e ao retornar para a Inglaterra, por curiosidade, liguei para o banco (ainda era possível ligar para os bancos e falar com alguém conhecido), e me disseram que meu cheque tinha sido descontado mas havia diversas assinaturas no verso. Em outras palavras, o cheque havia passado de uma pessoa para outra exatamente como se fosse dinheiro.

O fechamento dos bancos irlandeses oferece uma vívida ilustração da definição de dinheiro: qualquer coisa aceita como pagamento. Naquela época, notas e moedas eram um terço do dinheiro na economia irlandesa, e os dois terços restantes eram depósitos bancários. A maioria das transações usava cheques, mas o pagamento com cheque exige que os bancos garantam que a pessoa tem recursos para confirmar seus pagamentos em papel.

Em um sistema bancário em funcionamento, o cheque é compensado ao final do dia, e o banco credita o valor na conta corrente da loja. Se o subscritor do cheque não tem dinheiro suficiente para cobrir o valor, o banco devolve o cheque e o proprietário da loja descobre imediatamente que precisa receber de outra maneira. Por isso, as pessoas geralmente evitam passar cheques sem fundo.

Cartões de crédito ou de débito ainda não eram muito usados. Hoje em dia, um cartão de débito verifica instantaneamente o saldo da sua conta bancária e desconta o valor. Se você pega um empréstimo para comprar um carro, o banco credita na sua conta corrente e então você pode fazer um cheque, usar o cartão de crédito ou débito, ou fazer uma transferência bancária para o vendedor do carro. Tudo isso é dinheiro em uma economia moderna.

Então, o que acontece quando os bancos fecham as portas e todos sabem que os cheques não serão devolvidos, mesmo se o subscritor do cheque não tiver dinheiro? Alguém aceitará cheques? Qual o problema de simplesmente fazer um cheque para comprar um carro quando não há dinheiro suficiente na conta corrente ou no cheque especial? Se você começar a pensar assim, não conseguirá confiar em ninguém que ofereça um cheque em troca de bens ou serviços, e insistirá em receber dinheiro vivo. No entanto, não há dinheiro suficiente em circulação para financiar todas as transações que as pessoas precisam fazer. Todas as pessoas teriam que reduzir suas despesas e a economia sofreria com isso.

Como a Irlanda evitou esse destino? Como vimos, tudo aconteceu nos pubs. Os cheques foram aceitos como se fossem dinheiro por causa da confiança que o proprietário do pub desfrutava entre a comunidade. Os publicans (proprietários de pubs) passavam horas conversando com seus clientes, e estavam dispostos a aceitar cheques — que não podiam ser descontados no sistema bancário — como pagamento daqueles que julgavam confiáveis. Durante o período de seis meses em que os bancos ficaram fechados, pessoas e empresas pagaram cerca de 5 bilhões de libras em cheques que não foram processados pelos bancos. O que ajudou foi a Irlanda ter, na época, um pub para cada 190 adultos. Com a ajuda de donos de pubs e lojas que conheciam seus clientes, os cheques puderam circular como se fossem dinheiro. Com o dinheiro das contas bancárias inacessível, os cidadãos da Irlanda criaram a quantia de dinheiro necessária para manter a economia crescendo durante o fechamento dos bancos.3 4

Os publicans irlandeses e credores individuais da cidade-mercado de Chambar provavelmente não perceberiam, dentre as muitas coisas que têm em comum, que ambos estavam criando moeda, e que, ao fazê-lo, estavam fornecendo um serviço essencial para o funcionamento de suas respectivas economias.5

É claro que nem todos passam pelos testes de confiabilidade estabelecidos pelos proprietários de pubs e credores. E, em Chambar e em Nova York, alguns dos que conseguem empréstimos pagam taxas de juros mais altas do que outros.

10.1 Moeda e riqueza

Tomar empréstimos e emprestar dinheiro, assim como a confiança que torna essas transações possíveis, são atos cuja finalidade é deslocar consumo e produção ao longo do tempo. Os credores oferecem recursos para que o agricultor compre fertilizantes hoje, e ele irá pagá-los depois da colheita, desde que a safra não seja destruída por uma seca. Quem faz um empréstimo consignado receberá seu pagamento ao final do mês mas precisa comprar comida agora, então, quer trazer parte do seu poder de compra para o presente.

A passagem do tempo é parte essencial de conceitos como moeda, renda, riqueza, consumo, poupança e investimento.

Moeda

moeda
Moeda é algo que facilita as trocas (o que é chamado de meio de troca), e consiste em notas, depósitos bancários ou qualquer outra coisa que possa ser usada para adquirir bens e serviços, e que geralmente é aceita como pagamento porque outras pessoas podem usá-la com a mesma finalidade. Esse ”porque” é importante e diferencia transações facilitadas por dinheiro de simples trocas, nas quais os bens são permutados diretamente sem que dinheiro troque de mãos.

A moeda é um meio de troca que consiste em notas ou depósitos bancários, ou qualquer outra coisa que possa ser usada para adquirir bens e serviços, e que seja aceita como pagamento porque outros podem usá-la com a mesma finalidade. Esse ”porque” é importante e diferencia as transações facilitadas por dinheiro das permutas. Em uma economia de permutas, posso trocar minhas maçãs por suas laranjas porque eu quero algumas laranjas, não porque quero usar as laranjas para pagar meu aluguel. O dinheiro torna possível fazer mais transações porque não é difícil encontrar alguém que fique satisfeito em receber o seu dinheiro (em troca de algo), mas se desfazer de uma grande quantidade de maçãs pode ser problemático. É por isso que a permuta tem um papel limitado em praticamente todas as economias modernas.6

Para que a moeda cumpra sua função, quase todos precisam acreditar que, se aceitarem seu dinheiro em troca por um bem ou serviço, poderão usá-lo para comprar outra coisa. Em outras palavras, eles precisam confiar que outras pessoas aceitarão seu dinheiro como pagamento. Governos e bancos geralmente são os que proporcionam essa confiança. Entretanto, o fechamento dos bancos irlandeses mostra que, quando existe confiança suficiente entre as famílias e as empresas, o dinheiro pode funcionar na ausência de bancos. Os publicans e as lojas aceitaram cheques como pagamento mesmo sabendo que não poderiam descontá-los em um banco num futuro próximo. À medida que o conflito bancário se prolongava, o cheque dado ao pub ou à loja ia sendo amparado por uma longa rede de cheques não depositados recebidos por pessoas e empresas que os passavam adiante. Alguns cheques circularam muitas vezes, com o endosso do proprietário do pub ou da loja no verso, exatamente como uma cédula bancária.

Essa é a característica fundamental da moeda: é um meio de troca.

O dinheiro permite que o poder de compra seja transferido entre pessoas para que possam trocar bens e serviços, mesmo quando o pagamento ocorre numa data futura (por exemplo, pela compensação de um cheque, pagamento do cartão de crédito ou liquidação do saldo de comércio). Assim, a moeda requer confiança para funcionar.

Riqueza

riqueza
Estoque de coisas que se possui ou o valor deste estoque. Inclui o valor de mercado de uma casa ou de um carro, de qualquer terreno, construção, maquinário ou outros bens de capital que alguém possa ter, e quaisquer ativos financeiros como ações e títulos. As dívidas – por exemplo, um financiamento que se deve a um banco – são subtraídas. As dívidas que serão recebidas de outras pessoas são somadas.

Uma forma de pensar sobre riqueza é defini-la como a maior quantidade que você pode consumir sem pedir emprestado, após ter pagado suas dívidas e ter recebido o que lhe devem — por exemplo, se você vendeu sua casa, seu carro ou qualquer coisa que era sua.

capital humano
Estoque de conhecimento, habilidades, atributos comportamentais e características pessoais que determinam a produtividade do trabalho ou o rendimento do trabalho de um indivíduo. Investimento em capital humano por meio de educação, treinamento e socialização pode aumentar o estoque e tal investimento é uma das fontes de crescimento econômico. Parte da dotação de um indivíduo. Veja também: dotação.

O termo riqueza também é usado em um sentido mais amplo para incluir aspectos imateriais, tais como sua saúde, suas habilidades, e sua capacidade de ganhar seu sustento (seu capital humano). Neste capítulo, vamos usar a definição mais restrita de riqueza material.

Renda

renda
Quantidade de lucros, juros, aluguéis, rendas do trabalho e outros pagamentos (inclusive transferências do governo) restante após o pagamento de impostos, medida ao longo de um período de tempo como um ano. É o valor máximo que você pode consumir e manter sua riqueza inalterada. Também conhecido como: renda disponível. Veja também: renda bruta.
rendimentos
Salários, fixos ou por hora e outras rendas do trabalho.

Renda é a quantidade de dinheiro que você recebe ao longo de um período de tempo, seja por meio de rendimentos, de mercado, de investimentos ou do governo.

variável de fluxo
Quantidade medida por unidade de tempo, tal como a renda anual ou o salário por hora.
variável de estoque
Quantidade medida em determinado momento no tempo. Suas unidades não dependem do tempo. Veja também: fluxo.

Por ser medida ao longo de determinado período de tempo (uma semana ou um ano), a renda é uma variável de fluxo. Riqueza é uma variável de estoque o que significa que não tem uma dimensão temporal: apenas assume determinado valor em dado momento do tempo. Neste capítulo consideramos a renda após os impostos e transferências, também conhecida como renda disponível.

Para lembrar da diferença entre riqueza e renda, imagine que você está tentando encher uma banheira, como na Figura 10.1. A riqueza é a quantidade (estoque) de água na banheira, enquanto a renda é o fluxo de água entrando na banheira. O fluxo é medido em litros (ou galões) por minuto; o estoque de água é medido por litros (ou galões) em um momento específico no tempo.

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Figura 10.1 Riqueza, renda, depreciação e consumo: a analogia da banheira.

Como vimos, a riqueza frequentemente assume uma forma física, como uma casa, um carro, um escritório ou uma fábrica. O valor da riqueza tende a diminuir, tanto pelo uso quanto simplesmente pela passagem do tempo.

depreciação
Perda do valor de uma forma de riqueza, que ocorre tanto pelo uso (desgaste) quanto pela passagem do tempo (obsolescência).
renda líquida
Renda bruta menos a depreciação. Veja também: renda, renda bruta, depreciação.

Esta redução no valor do estoque de riqueza ao longo do tempo é chamada de depreciação. Utilizando a analogia da banheira, a depreciação seria a quantidade de água evaporada. Assim como a renda, a depreciação é um fluxo (pode ser medida em litros por ano), mas um fluxo negativo. Logo, quando consideramos a depreciação, temos que diferenciar renda líquida de renda bruta. A renda bruta é o fluxo que entra na banheira (lembre-se que renda se refere à renda disponível ou à renda após os impostos e transferências), enquanto que a renda líquida é este fluxo menos a depreciação. Renda líquida é a quantidade máxima que você poderia gastar sem que sua riqueza se alterasse.

Despesa

consumo (C)
Gastos em bens de consumo, que incluem tanto bens e serviços de curta duração quanto bens de longa duração, os chamados bens de consumo duráveis.

A banheira também tem um tubo ou cano de escoamento. O fluxo de escoamento é chamado de despesa de consumo, e reduz a riqueza assim como a renda líquida a aumenta.

poupança
Ocorre quando a despesa de consumo é menor do que a renda líquida, o que aumenta a riqueza. Veja também: riqueza.
investimento (I)
Gastos em bens de capital recém produzidos (máquinas e equipamentos) e edificações, incluindo novas residências.

Um indivíduo (ou família) poupa quando seu consumo é menor que sua renda líquida, então sua riqueza aumenta. A riqueza é a acumulação da poupança passada e presente. Uma das formas que a poupança pode assumir é a compra de ativos financeiros, tais como ações de uma empresa ou títulos da dívida pública. Ainda que na linguagem cotidiana essas compras geralmente sejam chamadas de ”investimento”, em termos econômicos, investimento significa despesa com bens de capital, como maquinários ou construções.

A distinção entre investimento e compra de ações ou títulos pode ser ilustrada por uma empresa com uma única proprietária. Ao final do ano, a proprietária decide o que fazer com seu lucro líquido. A partir de sua renda líquida, a proprietária determina suas despesas de consumo para o ano seguinte e poupa o restante. Normalmente, a poupança assume a forma de depósitos bancários, já que a renda da proprietária é armazenada no banco. Com sua poupança, ela poderia comprar ativos financeiros como ações ou títulos, os quais proporcionam recursos a outras empresas ou ao governo. Ou, ao invés disso, poderia gastar com novos ativos para expandir seu negócio, o que seria considerado um investimento.

Questão 10.1 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Sua riqueza material é a maior quantia que você pode gastar sem pedir um empréstimo, e inclui o valor da sua casa, carro, poupança financeira e capital humano.
  • A renda líquida é o valor máximo que você poderia consumir mantendo sua riqueza inalterada.
  • Em economia, investimento significa poupança em forma de ativos financeiros tais como ações e títulos.
  • Depreciação é a perda sofrida pela sua poupança financeira devido a movimentos desfavoráveis no mercado.
  • Capital humano – como sua saúde, suas habilidades e sua capacidade de ganhar seu sustento – é sua riqueza imaterial.
  • Renda líquida é o fluxo que alimenta seu estoque de riqueza, logo, se você o consumir totalmente, sua riqueza fica inalterada.
  • Ainda que na linguagem cotidiana isso seja às vezes chamado de investimento, em economia, o investimento significa despesas com bens de capital, como maquinários, equipamentos e construções residenciais.
  • Depreciação é a perda de valor sofrida por uma forma de riqueza devido ao desgaste ou à passagem do tempo.

Questão 10.2 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

O Sr. Bond tem uma riqueza de £500.000. Ele tem rendas de mercado de £40.000 por ano, sobre as quais paga 30% de imposto. A riqueza do Sr. Bond inclui alguns equipamentos, que depreciam a £5.000 por ano. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • A renda disponível do Sr. Bond é de £40.000.
  • A renda líquida do Sr. Bond é de £28.000.
  • O valor máximo de despesa de consumo possível para o Sr. Bond é de £23.000.
  • Se o Sr. Bond decide gastar 60% de sua renda líquida em consumo e o resto em investimento, então seu investimento será de £9.200.
  • A renda disponível do Sr. Bond é sua renda de mercado menos os impostos, o que resulta em £40.000 × 0,7 = £28.000.
  • A renda líquida do Sr. Bond é sua renda disponível menos a depreciação, o que resulta em £28.000 – £5.000 = £23.000.
  • £23.000 é a renda líquida do Sr. Bond. O consumo dessa quantia não altera sua riqueza. Entretanto, o Sr. Bond também pode consumir toda a sua riqueza. Portanto, sua despesa de consumo máxima possível é £500.000 + £23.000 = £523.000.
  • 60% da sua renda líquida é £13.800, logo restam £9.200 para gastar em investimento.

10.2 Empréstimo: antecipando o consumo no tempo

Para entender o mecanismo de tomar e conceder empréstimos, vamos usar conjuntos de possibilidades e curvas de indiferença. Nos Capítulos 3 e 5, você estudou como Alexei e Ângela fazem escolhas entre objetivos conflitantes, tais como tempo livre e notas ou alqueires de cereal. Eles faziam suas escolhas a partir do conjunto de possibilidades, com base nas preferências descritas por curvas de indiferença que representam quanto eles valorizavam um objetivo em relação a outro.

custo de oportunidade
Fazer uma escolha exige abrir mão de uma alternativa. O custo de oportunidade é o benefício líquido que a alternativa descartada proporcionaria.

Aqui você verá que a mesma análise do conjunto de possibilidades e da curva de indiferença se aplica para escolher entre ter algo agora e ter algo mais tarde. Em capítulos anteriores, vimos que abrir mão de tempo livre é uma forma de obter mais bens, ou notas, ou grãos. Agora veremos que abrir mão de alguns bens que poderiam ser consumidos imediatamente às vezes nos permitirá ter mais bens no futuro. O custo de oportunidade de ter mais bens agora é ter menos bens mais tarde.

Tomar emprestado e emprestar nos permite rearranjar nossa capacidade de adquirir bens e serviços ao longo do tempo. Tomar emprestado nos permite comprar mais agora, mas nos obriga a comprar menos depois. Para ver como isso funciona, considere Júlia, que precisa consumir agora, mas não tem dinheiro hoje. Ela sabe que, no próximo período (no futuro), terá $100 de seu salário ou de sua colheita. A situação de Júlia é mostrada na Figura 10.2. Cada ponto da curva mostra uma combinação da capacidade de consumo de Júlia agora e mais tarde. Assumimos que ela gaste tudo que tem, então cada ponto na figura indica seu consumo presente (medido no eixo horizontal) e futuro (medido no eixo vertical).

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Figura 10.2 Empréstimo: a taxa de juros e o conjunto de possibilidades.

Júlia não tem nada
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Júlia não tem nada

Júlia poderia, por exemplo, tomar $91 emprestados agora e prometer pagar os $100 que terá no futuro ao credor. A taxa de juros seria de 10%.

Trazendo a renda futura para o presente
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Trazendo a renda futura para o presente

Júlia poderia, por exemplo, tomar $91 emprestados agora e prometer pagar os $100 que terá no futuro ao credor. A taxa de juros seria de 10%.

Tomando um empréstimo menor
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Tomando um empréstimo menor

À mesma taxa de juros (10%), Júlia também poderia tomar $70 emprestados para gastar agora, e restituir $77 ao final do ano. Nesse caso, ela teria $23 para gastar no próximo ano.

Tomando um empréstimo ainda menor
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Tomando um empréstimo ainda menor

À mesma taxa de juros (10%), Júlia também poderia tomar $30 emprestados para gastar agora, e restituir $33 ao final do ano. Nesse caso, ela teria $67 para gastar no próximo ano.

O conjunto de possibilidades de Júlia
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O conjunto de possibilidades de Júlia

O limite do conjunto de possibilidades de Júlia é sua fronteira de possibilidades, representada para uma taxa de juros de 10%.

A fronteira de possibilidades de Júlia
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A fronteira de possibilidades de Júlia

Júlia pode tomar um empréstimo agora e escolher qualquer combinação sobre sua fronteira de possibilidades.

Uma taxa de juros mais alta
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Uma taxa de juros mais alta

Se, ao invés de 10%, a taxa de juros fosse 78%, Júlia poderia pedir um empréstimo de, no máximo, $56 agora.

O conjunto de possibilidades
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O conjunto de possibilidades

O conjunto de possibilidades a uma taxa de juros de 78% é a área sombreada mais escura, enquanto o conjunto de possibilidades a uma taxa de juros de 10% é dado pela área sombreada escura mais a área sombreada clara.

Júlia está inicialmente no ponto denominado ”dotação de Júlia” na Figura 10.2. Ela está pensando em tomar um empréstimo consignado para consumir agora (ou poderia ser uma agricultora pedindo um empréstimo para financiar seu consumo antes de colher e vender sua safra).

Júlia poderia, por exemplo, tomar $91 emprestados agora e prometer pagar ao credor os $100 que terá no futuro. Sua restituição total de $100 incluiria o principal (o valor que ela tomou emprestado) mais os juros cobrados à taxa r, ou:

\[\begin{align*} \text{pagamento} & = \text{principal + juros} \\ &= 91 + 91r \\ &= 91(1+r) \\ &= \$100 \end{align*}\]
taxa de juros
Preço de antecipar poder de compra no tempo. Também conhecido como: taxa de juros nominal. Veja também: taxa de juros real.

E se “no futuro” significa daqui a um ano, então, a taxa de juros anual r é:

\[\begin{align*} \text{taxa de juros} &= \frac{\text{pagamento}}{\text{principal}} - 1 \\ &= \frac{100}{91} -1 \\ &= 0.1 = 10\% \end{align*}\]

Você pode pensar na taxa de juros como o preço de antecipar poder de compra no tempo.

À mesma taxa de juros (10%), Júlia também poderia tomar $70 emprestados para gastar agora, e restituir $77 ao final do ano, ou seja:

\[\begin{align*} \text{pagamento} &= 70 + 70r \\ &= 70(1+r) \\ &= \$77 \end{align*}\]

Nesse caso, ela teria $23 para gastar no próximo ano. Outra combinação possível é tomar emprestado e gastar apenas $30 agora, o que deixaria Júlia com $67 para gastar no próximo ano, após pagar o empréstimo.

Todas as suas combinações possíveis de consumo presente e futuro — ($91, $0), ($70, $23), ($30, $67), e assim por diante — geram a fronteira de possibilidades mostrada na Figura 10.2, que é o limite do conjunto factível quando a taxa de juros é de 10%.

A possibilidade de tomar um empréstimo significa que Júlia não é obrigada a consumir somente no futuro. Ela pode tomar empréstimo agora e escolher qualquer combinação em sua fronteira de possibilidades. Porém, quanto mais consumir agora, menos pode consumir no futuro. Com uma taxa de juros de r = 10%, o custo de oportunidade de gastar um dólar agora é que Júlia terá 1,10 = 1 + r dólares a menos para gastar no futuro.

Somar um à taxa de juros, (1 + r), resulta na taxa marginal de transformação do consumo futuro para o presente, pois para ter uma unidade do bem agora, você tem que abrir mão de 1 + r bens no futuro. Este é o mesmo conceito de taxa marginal de transformação de bens, cereal ou média final em tempo livre que você encontrou nos Capítulos 3 e 5.

Suponha agora que, ao invés de 10%, a taxa de juros seja de 78%, a taxa média paga pelos agricultores em Chambar. À nova taxa, o máximo que Júlia pode pegar emprestado é $56, pois, a 78%, os juros sobre um empréstimo de $56 somam $44, comprometendo os $100 da sua renda futura. Portanto, sua fronteira de possibilidades gira para dentro, e o conjunto factível se reduz. Como o preço de antecipar poder de compra futuro aumentou, a capacidade de consumir no presente caiu, assim como a sua capacidade de consumir cereal cairia se o preço do cereal subisse (assumindo que você não é um produtor de cereal).

É claro que, desde que o empréstimo seja pago, o credor se beneficiará de uma taxa de juros mais alta, então há um conflito de interesses entre o devedor e o credor.

10.3 Impaciência e retornos marginais decrescentes de consumo

Dadas as oportunidades de antecipar consumo futuro mostradas pelo conjunto de possibilidades, o que Júlia decide fazer? A quantidade de consumo que ela decidirá adiantar depende de quão impaciente Júlia está. Ela poderia estar impaciente por dois motivos:

  • Ela prefere suavizar seu consumo em vez de consumir tudo no futuro e nada agora.
  • Ela pode ser uma pessoa impaciente.

Suavizando o consumo

Júlia gostaria de suavizar seu consumo porque aprecia ter uma unidade adicional de algo quando ainda não consumiu muito daquilo. Pense no que acontece com a comida: as primeiras mordidas de uma refeição normalmente são muito mais gostosas do que a terceira vez que você a saboreou. Essa é uma realidade psicológica fundamental, por vezes chamada de lei da saciedade das necessidades.

retornos marginais decrescentes de consumo
O valor que um indivíduo atribui a uma unidade adicional de consumo decresce quanto mais o indivíduo consome. Também conhecido como: redução da utilidade marginal.

Em termos mais gerais, o valor para o indivíduo de uma unidade extra de consumo de determinado período diminui à medida que a quantidade consumida aumenta: são os chamados retornos marginais decrescentes de consumo. Você já viu algo semelhante no Capítulo 3, no qual Alexei experimentava retornos marginais decrescentes do tempo livre. Mantendo suas notas constantes, quanto mais tempo livre ele tinha, menor era o valor de cada unidade adicional de tempo livre para ele em relação ao valor de suas notas.

Utilize a análise na Figura 10.3a para ver como Júlia pode escolher seus consumos presente e futuro, e como suas preferências podem ser representadas por curvas de indiferença. Assumir retornos marginais decrescentes de consumo a cada período significa que Júlia gostaria de suavizar seu consumo, ou seja, evitar consumir muito em um período e pouco em outro.

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Figura 10.3a Suavizando o consumo: retornos marginais decrescentes de consumo.

As escolhas de Júlia
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As escolhas de Júlia

A linha pontilhada mostra as combinações de consumos presente e futuro que Júlia pode escolher.

Retornos marginais decrescentes de consumo
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Retornos marginais decrescentes de consumo

A curva de indiferença de Júlia se inclina na direção da origem como consequência dos retornos marginais decrescentes de consumo a cada período: quanto mais bens ela tem no presente, menos valor ela dá a um bem adicional agora em relação a ter mais bens no futuro. A inclinação da curva de indiferença é a taxa marginal de substituição (TMS) entre o consumo agora e o consumo no futuro.

Quais seriam as escolhas de Júlia?
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Quais seriam as escolhas de Júlia?

A TMS em C é alta (a inclinação da sua curva de indiferença é acentuada): o consumo de Júlia é pequeno agora e maior no futuro, então a hipótese de retornos marginais decrescentes significa que ela gostaria de trazer um pouco de consumo futuro para o presente. A TMS em E é baixa: o consumo agora é elevado e menor no futuro, então a hipótese de retornos marginais decrescentes significa que Júlia gostaria de levar um pouco do consumo para o futuro. Sendo assim, ela escolherá um ponto entre C e E.

A TMS se reduz
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A TMS se reduz

Podemos ver que a TMS está caindo quando olhamos ao longo da curva de indiferença de C para E: a inclinação é mais acentuada em C do que em E.

A escolha ótima de Júlia
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A escolha ótima de Júlia

Dada as escolhas mostradas pela linha CE, Júlia escolherá o ponto F, que está na curva de indiferença mais alta possível. Ela prefere suavizar o consumo presente e o futuro.

Impaciência pura, ou quão impaciente você é

Se Júlia sabe que pode fazer duas refeições amanhã mas não faz nenhuma hoje, vimos então que os retornos marginais decrescentes do consumo podem explicar porque ela pode preferir fazer uma refeição hoje e uma amanhã. Observe que Júlia optaria por fazer uma refeição agora não porque é uma pessoa impaciente, mas porque espera não estar com fome no futuro: ela prefere suavizar seu consumo de comida.

impaciência pura
Característica de uma pessoa que valoriza uma unidade adicional de consumo agora em detrimento de ter uma unidade adicional no futuro, quando a quantidade de consumo é a mesma no presente e no futuro. Surge quando uma pessoa está impaciente para consumir mais agora porque dá menos valor ao consumo futuro, por miopia, fraqueza de vontade ou outras razões.

Entretanto, há uma outra razão para preferir o bem agora, chamada impaciência pura. Para ver se alguém é impaciente, perguntamos se valoriza um bem no presente mais do que no futuro quando tem a mesma dotação inicial nos dois períodos. Existem duas razões para a impaciência pura:

  • Miopia (vista curta): as pessoas experimentam a satisfação imediata da fome ou de algum outro desejo de forma mais intensa do que imaginam esta mesma satisfação numa data futura.
  • Prudência: as pessoas sabem que podem não estar aqui no futuro, então, escolher o consumo agora pode ser uma boa ideia.

Impaciência

Qualquer preferência de trazer o consumo do futuro para o presente. Essa preferência pode ser derivada de:

  • impaciência pura
  • retornos marginais decrescentes de consumo

Para ver o que impaciência pura significa, comparamos dois pontos na mesma curva de indiferença da Figura 10.3b. No ponto A, Júlia tem $50 agora e $50 no futuro. Perguntamos quanto consumo adicional ela precisaria ter mais tarde para compensar a perda de $1 agora. O Ponto B, na mesma curva de indiferença, nos dá a resposta. Se ela tivesse apenas $49 agora, precisaria de $51,50 no futuro para permanecer na mesma curva de indiferença e estar igualmente satisfeita. Logo, Júlia precisaria de $1,50 no futuro para compensá-la por perder $1 agora. Júlia tem impaciência pura porque em vez de preferir suavizar perfeitamente seu consumo, ela dá mais valor a uma unidade adicional de consumo hoje do que no futuro.

Impaciência pura
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Impaciência pura

Figura 10.3b Impaciência pura.

A inclinação da curva de indiferença no ponto A na Figura 10.3b é 1,5 (em valor absoluto): isto significa que Júlia valoriza 1,5 vezes mais uma unidade adicional de consumo presente do que uma unidade adicional de consumo futuro.

Exercício 10.1 As consequências da impaciência pura

  1. Na Figura 10.3b desenhe as curvas de indiferença de uma pessoa que seja mais impaciente do que Júlia para qualquer nível de consumo agora e no futuro.

  2. Desenhe um conjunto de curvas de indiferença para Júlia se ela experimentasse retornos marginais decrescentes de consumo mas tivesse impaciência pura. Será que ela preferiria suavizar seu consumo?

  3. Desenhe um conjunto de curvas de indiferença para Júlia se ela não experimentasse retornos marginais decrescentes de consumo e não tivesse impaciência pura.

Questão 10.3 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

A Figura 10.3a mostra as curvas de indiferença de Júlia para o consumo nos períodos 1(presente) e 2 (no futuro). Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • A inclinação da curva de indiferença é uma taxa marginal de substituição entre o consumo nos dois períodos.
  • O retorno marginal do consumo no período 1 é mais alto em E do que em C.
  • O consumo de Júlia é mais igualmente distribuído (mais ‘suavizado’) em C do que em E. Portanto, ela prefere a opção de consumo C à E.
  • Consumir exatamente a mesma quantidade nos dois períodos é a opção preferencial de Júlia.
  • Para permanecer na mesma curva de indiferença, a mudança de utilidade decorrente de uma variação marginal no consumo presente deve ser compensada exatamente por uma mudança de utilidade devido a uma variação no consumo futuro.
  • Em E, Júlia consome mais agora do que em C. Devido aos retornos marginais decrescentes de consumo, o retorno marginal do consumo presente para Júlia é mais baixo em E do que em C.
  • Os dois pontos estão na mesma curva de indiferença. Portanto, ela ficará indiferente entre as duas.
  • Isso depende da taxa de juros (um mais a taxa de juros resulta na inclinação da fronteira de possibilidades) e do formato das curvas de indiferença. A escolha preferencial de Júlia está em F, ponto em que o consumo nos dois períodos não é necessariamente igual.

10.4 Empréstimos permitem suavizar ao trazer consumo para o presente

A taxa de desconto de uma pessoa

A taxa de desconto de uma pessoa, p, é uma medida de sua impaciência: do quanto ela valoriza uma unidade adicional de consumo presente em relação a uma unidade adicional de consumo futuro. Esta é dada pela inclinação da curva de indiferença entre consumo presente e consumo futuro, menos um.

Sua taxa de desconto depende de dois fatores:

  • Seu desejo de suavizar o consumo: este é afetado pela situação em que a pessoa se encontra (a atual distribuição entre consumo presente e futuro).

  • Sua impaciência pura pessoal: às vezes, também chamada de taxa de desconto subjetiva porque se baseia, em parte, no estado psicológico do indivíduo.

Quanto Júlia vai pedir emprestado? Combinando as Figuras 10.2 e 10.3a, teremos a resposta. Como nos outros exemplos de conjunto factível e curvas de indiferença, Júlia deseja alcançar a curva de indiferença mais alta possível, mas se vê limitada por sua fronteira de possibilidades. A curva de indiferença mais alta possível quando a taxa de juros é 10% será uma tangente à fronteira de possibilidades, representada pelo ponto E na Figura 10.4.

Aqui, ela escolhe pedir um empréstimo com o qual poderá consumir $58 no presente e devolver $64 depois, restando $36 para consumir no futuro. Sabemos que, no ponto de tangência, a inclinação da curva de indiferença é igual à inclinação na fronteira de possibilidades (caso contrário, as curvas se cruzariam). Definimos a taxa de desconto de uma pessoa, ρ (os economistas usam a letra grega chamada “rô”), como a inclinação da curva de indiferença menos um, que é uma medida de quanto Júlia valoriza uma unidade adicional de consumo agora em relação a uma unidade adicional de consumo no futuro.

Por exemplo, na Figura 10.3b, ρ = 50% no ponto A, pois uma unidade adicional de consumo hoje vale 1,5 unidades adicionais no futuro. Isso significa que Júlia pede emprestado apenas o suficiente para:

\[\begin{align*} \text{inclinação da curva de indiferença (TMS)} = \text{inclinação da fronteira de possibilidades (TMT)} \end{align*}\]

Sabemos que:

\[\begin{align*} \text{TMS} &= 1+\rho \\ \text{TMT} &= 1 + r \end{align*}\]

Então:

\[\begin{align*} \text{TMS} &= \text{TMT} \\ 1 + \rho &= 1 + r \end{align*}\]

Se subtrairmos 1 de ambos os lados dessa equação, teremos:

\[\begin{align*} \rho &= r \\ \text{taxa de desconto} &= \text{taxa de juros} \end{align*}\]

Sua taxa de desconto p depende tanto de seu desejo de suavizar o consumo quanto de seu grau de impaciência pura.

Utilize a análise na Figura 10.4 para ver como Júlia escolherá seu consumo quando a taxa de juros for 10%, e quando for 78%.

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Figura 10.4 Transferindo consumo ao longo do tempo por meio de empréstimos.

A fronteira de possibilidades de Júlia
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A fronteira de possibilidades de Júlia

Júlia deseja atingir a curva de indiferença mais alta possível, mas se vê limitada por sua fronteira de possibilidades.

A melhor opção de Júlia
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A melhor opção de Júlia

Quando a taxa de juros for 10%, a curva de indiferença mais alta possível será tangente à fronteira de possibilidades, como mostra o ponto E.

TMS e TMT
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TMS e TMT

Nesse ponto, TMS = TMT.

A decisão de pedir um empréstimo
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A decisão de pedir um empréstimo

No ponto F, a taxa de desconto de Júlia, p, é maior do que a taxa de juros r, então ela preferiria antecipar o consumo no tempo. Um raciocínio semelhante elimina todos os pontos na fronteira de possibilidades com exceção de E.

Um aumento na taxa de juros
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Um aumento na taxa de juros

Se a taxa de juros a que ela pode tomar empréstimo aumenta, o conjunto de possibilidades fica menor.

O efeito de uma taxa de juros mais alta
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O efeito de uma taxa de juros mais alta

O melhor que Júlia pode fazer agora é pedir um empréstimo menor ($35 em vez de $58), como mostra o ponto G.

Exercício 10.2 Efeitos renda e substituição

  1. Utilize a Figura 10.4 para mostrar que a diferença no consumo atual às taxas de juros mais baixa e mais alta (em E e G), isto é, $23, é composta por um efeito renda e por um efeito substituição. Vale a pena revisar os conceitos de efeito renda e efeito substituição do Capítulo 3 antes de fazer este exercício.
  2. Porque os efeitos renda e substituição funcionam na mesma direção neste exemplo?

Questão 10.4 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

A Figura 10.4 exibe os níveis de consumo escolhidos por Júlia nos períodos 1 e 2. Ela não tem renda no período 1 (presente) e tem uma renda de $100 no período 2 (no futuro). A taxa de juros atual é de 10%. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Em F, a taxa de juros excede a taxa de desconto de Júlia (nível de impaciência).
  • Em E, Júlia está na curva de indiferença mais alta possível dado seu conjunto de possibilidades.
  • E é a escolha ótima de Júlia, pois ela consegue suavizar completamente seu consumo ao longo de dois períodos e consumir a mesma quantidade.
  • G não é uma escolha factível para Júlia.
  • Em F, a inclinação da curva de indiferença é mais acentuada do que a da fronteira de possibilidades. Portanto, a taxa de desconto de Júlia excede a taxa de juros.
  • E está na curva de indiferença mais alta possível porque qualquer curva de indiferença mais alta não tocaria a reta de restrição orçamentária.
  • Em E, Júlia consome 58 no período 1 e 36 no período 2.
  • G está no conjunto de possibilidades de Júlia. Ela não o escolhe porque este ponto não é sua escolha ótima (está em uma curva de indiferença mais baixa).

10.5 Empréstimos e estoques: suavizando e levando o consumo para o futuro

Agora considere Marco, um indivíduo que enfrenta uma situação diferente da de Júlia, que estava pensando em pedir um empréstimo consignado, e da de um agricultor em Chambar, que estava em busca de um empréstimo até a colheita. Enquanto Júlia decide quanto pedir emprestado, Marco possui alguns bens ou recursos que valem $100, mas (ainda) não espera receber qualquer renda no futuro. Tanto Júlia quanto Marco irão obter $100 em algum momento, mas o fator tempo gera diferenças: a riqueza de Marco, em sua definição estrita, é de $100, enquanto a riqueza de Júlia é zero.

Como vimos, Júlia, que receberá o salário de $100 no futuro, quer pedir um empréstimo. Sua situação dá a ela um forte desejo de suavizar os gastos tomando um empréstimo. Imagine como seria a curva de indiferença que passa pela dotação inicial de Júlia. Como mostra a Figura 10.5, esta curva é muito inclinada. Como Júlia atualmente não tem nada, ela apresentará uma forte preferência por aumentar seu consumo imediato.

curva de indiferença de reserva
Curva que indica as alocações (combinações) que um indivíduo valoriza tanto quanto suas opções de reserva.

Esta é a curva de indiferença de reserva de Júlia, pois é formada por todos os pontos em que ela estaria tão bem quanto em sua opção de reserva, que é sua dotação inicial sem tomar ou conceder empréstimos (a dotação e a curva de indiferença de reserva de Júlia são semelhantes àquelas de Ângela, a agricultora do Capítulo 5).

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Figura 10.5 Curvas de indiferença de reserva e dotações

Veja a curva de indiferença de Marco passando pela sua dotação inicial, que é $100 agora e nada no futuro. Como mostra a Figura 10.5, essa curva é bastante plana no presente, indicando que ele está procurando uma forma de transferir parte do seu consumo para o futuro.

As curvas de indiferença de Marco e Júlia são semelhantes, portanto, seus níveis de impaciência pura também são. Os dois diferem em relação à situação em que se encontram, não em suas preferências. Júlia quer um empréstimo porque tem menos recursos no presente, ao contrário de Marco. É por isso que ela está impaciente: precisa suavizar seu consumo.

Marco tem $100 em grãos recém colhidos e não tem dívidas a serem pagas. Ele poderia consumir tudo agora mas, como vimos, essa provavelmente não seria a melhor escolha que poderia fazer dadas as circunstâncias:

  • Assumimos que a renda dele no futuro será zero.
  • Como Júlia, ele tem retornos marginais decrescentes do consumo.

Para suavizar, ele quer transferir alguns bens para o futuro. Ele poderia armazenar alguns grãos, mas se fizesse isso, os ratos poderiam comer uma parte. Os ratos são uma forma de depreciação. Os grãos que eles comem representam uma redução na riqueza de Marco devido à passagem do tempo. Então, considerando os ratos, se Marco não consumisse nada durante esse período, teria apenas $80 em grãos um ano depois. Isso significa que o custo de transferir o consumo de grãos do presente para o futuro é de 20% ao ano.

Na Figura 10.6, vemos que a dotação de Marco está no eixo horizontal, pois ele tem $100 de grãos disponíveis agora. A linha escura mostra a fronteira de possibilidades de Marco se ele escolhe estocar, e a área sombreada escura mostra seu conjunto de possibilidades. Se essa fosse a única opção, e se suas curvas de indiferença fossem como as indicadas, ele certamente iria estocar parte dos grãos. Na Figura 10.6, uma parte da sua fronteira de possibilidades está fora da curva de indiferença de dotações, então ele estaria em uma melhor situação ao estocar parte dos grãos.

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Figura 10.6 Suavizando o consumo com estoques e empréstimos.

Marco possui riqueza hoje
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Marco possui riqueza hoje

Marco tem $100 de grãos disponíveis agora.

A fronteira de possibilidades de Marco
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A fronteira de possibilidades de Marco

A linha escura mostra a fronteira de possibilidades de Marco se ele estocar parte dos grãos, e a área sombreada escura mostra seu conjunto de possibilidades.

As preferências de Marco
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As preferências de Marco

As curvas de indiferença de reserva de Marco passam por suas dotações.

A decisão de armazenar
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A decisão de armazenar

O ponto H sobre a curva de indiferença de Marco denota a quantidade que ele escolhe armazenar em estoque.

A decisão de conceder empréstimos
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A decisão de conceder empréstimos

A linha clara mostra a fronteira de possibilidades quando Marco empresta a 10%.

O efeito de conceder empréstimos
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O efeito de conceder empréstimos

Agora Marco pode alcançar uma curva de indiferença mais alta.

Mas quanto ele irá emprestar? Assim como Júlia, Marco encontrará a quantidade de estoque que o leva à curva de indiferença mais alta possível no ponto de tangência entre a curva de indiferença e a fronteira de possibilidades. Este é o ponto H, então Marco vai consumir $68 em grãos agora e $26 no futuro (os ratos devoram $6 dos grãos). No ponto H, Marco igualou sua TMS entre consumo presente atual e futuro com a TMT, que é o custo de transferir bens do presente para o futuro.

Ele poderia evitar os ratos vendendo os grãos e guardando $100 debaixo do colchão. Sua fronteira de possibilidades seria uma linha reta (não exibida) indo dos $100 de consumo agora para o consumo futuro de $100. Estamos assumindo que sua nota de $100 não será roubada e que $100 comprarão a mesma quantidade de grãos agora e no futuro porque não existe inflação (explicamos inflação e seus efeitos no Capítulo 13). Sob essas premissas, o dinheiro guardado debaixo do colchão é definitivamente melhor do que estocar grãos se houver ratos.

Um plano melhor seria emprestar esse dinheiro, se Marco conseguisse encontrar um tomador confiável. Caso emprestasse e pudesse ter certeza que receberia $(1 + r) como pagamento para cada $1 emprestado, poderia então ter um consumo factível de 100 × (1 + r) no futuro ou qualquer das combinações ao longo da sua nova linha de consumo factível. A linha clara na Figura 10.6 mostra a fronteira de possibilidades quando Marco empresta a 10%. Como você pode ver na figura, comparado a estocar grãos ou guardar dinheiro debaixo do colchão, seu conjunto de possibilidades se expande com a oportunidade de emprestar dinheiro a juros. Marco pode alcançar uma curva de indiferença mais alta.

Como vimos, em uma economia contemporânea, há uma série de instrumentos financeiros que Marco pode usar para transferir consumo para o futuro ao conceder empréstimos, tais como depósitos a prazo ou títulos emitidos por empresas ou pelo governo.

Caso Marco tivesse uma oportunidade de investimento na qual pudesse investir seus ativos hoje de modo que valessem mais em um ano — por exemplo, caso tivesse terras nas quais pudesse plantar os grãos que já possui e aumentar sua colheita —, também poderia ampliar seu conjunto de possibilidades.

10.6 Investimento: outra forma de transferir consumo para o futuro

Se Marco tivesse algumas terras, poderia fazer ainda melhor. Ele poderia investir os grãos (plantando as sementes e alimentando seus animais para que trabalhassem no campo até a colheita). Esta oportunidade de investir expandiria ainda mais seu conjunto de possibilidades. Suponha que se ele investisse todos os seus grãos, poderia obter uma colheita de $150 no futuro, como mostra a Figura 10.7. Ele investiu $100, colheu $150, então teve um lucro de $150 − $100 = $50, ou uma taxa de retorno (lucros divididos pelo investimento exigido) de $50/$100 = 50%. A inclinação da linha vermelha é −1,5, na qual o valor absoluto (1,5) é a taxa marginal de transformação do investimento em retornos, ou 1 mais a taxa de retorno sobre os investimentos.

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Figura 10.7 Investindo em um projeto de alto retorno.

O retorno sobre o investimento
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O retorno sobre o investimento

Se Marco investisse todos os seus grãos, poderia colher $150 em grãos no futuro.

O retorno sobre o investimento
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O retorno sobre o investimento

A inclinação da linha vermelha é −1,5, na qual o valor absoluto (1,5) é 1 mais a taxa de retorno sobre os investimentos.

A escolha ótima de Marco
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A escolha ótima de Marco

Marco escolhe consumir $60 agora e $60 no futuro, como mostra o ponto K. Nesse ponto, a fronteira de possibilidades tangencia uma curva de indiferença.

Se Marco conseguisse tomar um empréstimo a 10%, rapidamente veria que poderia estar em uma situação melhor com um plano totalmente novo: investir tudo que tem, obtendo a colheita de $150 no próximo ano, mas também tomar um empréstimo agora, o que permitirá consumir mais tanto no presente quanto no futuro. Esse plano de ”investir tudo” está representado na Figura 10.8. O plano desloca a fronteira de possibilidades de Marco ainda mais para fora, como mostra a linha vermelha pontilhada. Marco acaba consumindo em um novo ponto L, com maior consumo agora e no futuro.

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Figura 10.8 Tomando um empréstimo para investir em um projeto de alto retorno.

A escolha ótima de Marco quando ele pode investir
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A escolha ótima de Marco quando ele pode investir

A escolha ótima de Marco quando ele pode investir é o ponto K.

Marco obtém um empréstimo
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Marco obtém um empréstimo

Se ele conseguisse um empréstimo a 10%, ficaria com um padrão de vida melhor investindo tudo o que tem. Isso expande seu conjunto de possibilidades, como mostra a linha vermelha pontilhada.

Escolha ótima após obter um empréstimo
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Escolha ótima após obter um empréstimo

Marco acaba consumindo no novo ponto L, com $80 agora e $62 no futuro.

A Figura 10.9 resume como funciona o plano “investir tudo e tomar um empréstimo” em comparação com as outras opções.

Plano (pontos nas Figuras 10.6 e 10.8) Taxa de retorno ou juros Consumo agora, consumo no futuro Investimento Classificação por utilidade (ou consumo combinado)
Estocando (H) −20% (perda) $68, $26 n/a Pior ($94)
Apenas concedendo empréstimo (J) 10% $65, $39 n/a Terceira melhor ($104)
Investindo apenas (K) 50% $60, $60 $40 Segunda melhor ($120)
Investindo e tomando empréstimo (L) 50% (investimento), −10% (concedendo empréstimo) $80, $62 $100 Melhor ($142)

Figura 10.9 Estocar, emprestar, investir e tomar um empréstimo dão a Marco muitos conjuntos de possibilidades.

Os conjuntos de possibilidades para todas as opções de Marco são mostrados na Figura 10.10.

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Figura 10.10 Opções para o indivíduo (Marco) que começa com ativos.

Voltemos a ver em que Marco difere de Júlia. Compare os conjuntos de possibilidades de Júlia representados na Figura 10.4 com os de Marco, cujas opções são mostradas na Figura 10.10.

Três diferenças entre Marco e Júlia explicam a disparidade nos seus resultados.

  • Marco começa com um ativo enquanto Júlia começa sem nada: Júlia tem a perspectiva de ter um ativo similar no futuro, mas isso coloca os dois em lados opostos do mercado de crédito.
  • Marco tem uma oportunidade de investimento produtivo enquanto Júlia não tem.
  • Marco e Júlia podem se deparar com taxas de juros diferentes. A diferença menos óbvia é que, se Marco (após investir todos os seus ativos a um retorno de 50%) quer transferir seu poder de compra para o futuro, pode tomar um empréstimo a 10% tendo sua renda futura como garantia. Por não ter ativos, Júlia, como os agricultores pobres de Chambar, pode não ter alternativa além de tomar um empréstimo a uma taxa mais alta, de 78%. O paradoxo é que Marco pode tomar emprestado a uma taxa de juros mais baixa porque ele não precisa do empréstimo.

Em resumo, tomar emprestado, conceder um empréstimo, estocar e investir são maneiras de antecipar o consumo de bens (para o presente) ou adiá-lo (para o futuro) no tempo.

As pessoas realizam essas operações porque:

  • Podem aumentar sua utilidade suavizando o consumo: ou transferindo-o para o presente, se tiverem impaciência pura.
  • Podem aumentar seu consumo em ambos os períodos: ao conceder um empréstimo ou investindo.

As pessoas diferem em quais dessas operações realizam (algumas tomam empréstimos, outras emprestam) porque:

  • Estão em situações diferentes: por exemplo, ter uma renda agora ou no futuro afetará suas taxas de desconto e suas oportunidades. Da mesma forma, alguns têm oportunidades de investimento (como Marco), enquanto outros não têm.
  • Diferem no nível de impaciência pura.

Exercise 10.3 An increase in the interest rate

  1. Utilize um diagrama como o da Figure 10.4 para mostrar os efeitos renda e substituição que um aumento na taxa de juros terá para Marco, que recebe sua dotação hoje.
  2. Compare esses efeitos com os de Júlia no Exercício 10.2 e explique seus resultados.

Exercício 10.4 Renda ao longo da vida

Considere a renda de uma pessoa durante toda a sua vida, desde que deixa a escola até sua aposentadoria. Explique como alguém pode passar de uma situação como a de Júlia para uma como a de Marco ao longo da vida (assuma que sua impaciência pura permaneça inalterada a vida toda).

Questão 10.5 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

A Figura 10.6 mostra a escolha de consumo de Marco nos períodos 1 (presente) e 2 (no futuro). Ele tem $100 em grãos no período 1 e não tem renda no período 2. Marco tem duas opções. No esquema 1, ele pode estocar os grãos que não tiver consumido no período 1, o que resulta em uma perda de 20% dos grãos por causa de pestes e de deterioração. No esquema 2, ele pode vender os grãos que não tiver consumido e emprestar dinheiro a 10%. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Com o esquema 1, se Marco consome $68 em grãos no período 1, pode consumir $32 em grãos no período 2.
  • Com o esquema 2, se Marco consome $68 em grãos no período 1, pode consumir $35 em grãos no período 2.
  • A taxa marginal de transformação é mais alta no esquema 1 do que no esquema 2.
  • Marco sempre estará em uma curva de indiferença mais alta no esquema 2 do que no esquema 1.
  • Por causa da perda de 20%, Marco só pode consumir 32 x 0,8 = $26 no período 2.
  • Ele economiza $32 que depois aumentam em 10%, para $35,20.
  • A TMT é de 0,8 no esquema 1 e de 1,1 no esquema 2.
  • A restrição orçamentária no esquema 2 é mais alta do que no esquema 1 em qualquer nível positivo de poupança.

Questão 10.6 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

A Figura 10.10 apresenta quatro possíveis fronteiras de possibilidades para Marco, que tem $100 em grãos no período 1 (presente) e não tem renda no período 2 (no futuro). No esquema 1, ele pode estocar os grãos que não tiver consumido no período 1, o que resulta em uma perda de 20% dos grãos por causa de pestes e deterioração. No esquema 2, ele pode vender os grãos que não tiver consumido e emprestar dinheiro a 10%. No esquema 3, ele pode investir os grãos restantes (por exemplo, utilizando-os como sementes) para obter um retorno de 50%. Finalmente, no esquema 4, ele pode investir toda a quantidade de grãos e tomar emprestado a 10%, tendo sua renda futura como garantia. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • 20% da depreciação do estoque significa que Marco está pior em H do que na sua dotação inicial, na qual consome o total dos $100 em grãos no período 1.
  • A escolha de consumo J só pode ser atingida sob o esquema 2.
  • Se a taxa de juros para emprestar aumenta, a fronteira de possibilidades no esquema 2 se inclina para dentro a partir do ponto 100 no eixo horizontal (tornando-se mais plana).
  • Se a taxa de juros para tomar emprestado aumenta, a fronteira de possibilidades no esquema 4 se inclina para dentro a partir do ponto 150 no eixo vertical (tornando-se mais inclinada).
  • Marco está em uma curva de indiferença mais alta em H do que na sua dotação inicial. Portanto, ele está em uma situação melhor.
  • J está no conjunto de possibilidades dos planos 2, 3 e 4. Portanto, pode ser atingido nesses três esquemas. Entretanto, J só é ótimo no esquema 2.
  • Com uma taxa de empréstimo maior, a fronteira de possibilidades se torna mais inclinada, deslocando-se a partir do ponto 100 no eixo horizontal. A intersecção com o eixo vertical será mais alta do que 110.
  • 150 no período 2 é factível a qualquer taxa de juros de forma que aquele ponto é fixo, mas uma taxa de juros maior implica que Marco pode tomar menos empréstimo no período 1. Assim, a restrição orçamentária intercepta o eixo horizontal abaixo de 136, tornando-se mais inclinada.

10.7 Ativos, passivos e patrimônio líquido

balanço patrimonial
Registro de ativos, passivos e patrimônio líquido de um agente econômico, tal como uma família, um banco, uma firma ou um governo.

Veremos que a riqueza de uma pessoa é um aspecto importante de sua situação no processo de conseguir um empréstimo, emprestar e investir, e que as pessoas com mais riqueza, como Marco, têm oportunidades que não estão disponíveis para aquelas com menos riqueza, como Júlia. Balanços patrimoniais são uma ferramenta essencial para entender como a riqueza muda quando uma pessoa ou uma firma empresta ou toma emprestado.

ativo
Qualquer coisa de valor que se possua. Veja também: balanço, passivo.
passivo
Qualquer coisa de valor que se deva. Veja também: balanço, ativo.
patrimônio líquido
Ativos menos passivos. Veja também: balanço, capital próprio.

Um balanço patrimonial resume o que a família ou firma possui e o que deve a outros. O que você possui (inclusive o que outros devem a você) é chamado de seus ativos e o que você deve é chamado de seus passivos (to be liable means to be responsible for something, in this case to repay your debts to others). A diferença entre seus ativos e seus passivos é chamada de patrimônio líquido. A relação entre ativos, passivos e patrimônio líquido está representada na Figura 10.11.

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Figura 10.11 Balanço patrimonial.

Quando os componentes de uma equação são tais que, por definição, o lado esquerdo é igual ao lado direito, esta é chamada de identidade contábil, ou simplesmente identidade. A identidade do balanço patrimonial afirma que:

\[\begin{align*} \text{ativos} \equiv \text{passivos} + \text{patrimônio líquido} \end{align*}\]

O patrimônio líquido é a poupança acumulada ao longo do tempo. Também podemos inverter a identidade subtraindo o passivo de ambos os lados, de modo que:

\[\begin{align*} \text{patrimônio líquido} &\equiv \text{ativos} - \text{passivos} \\ &\equiv \text{o que a família possui ou que lhe devem} \\ &- \text{o que a família deve aos outros} \end{align*}\]

Na analogia da banheira, a água contida representa a riqueza como poupança acumulada e é o mesmo que o patrimônio líquido. Como vimos, o patrimônio líquido ou riqueza aumenta com a renda, e diminui com o consumo e a depreciação. Para uma família, a renda aumenta os depósitos bancários, enquanto o consumo é pago com depósitos bancários. Como os depósitos bancários são um ativo para seus proprietários, essas operações afetam o lado do ativo do balanço patrimonial da família.

No entanto, sua riqueza ou patrimônio líquido não muda quando você empresta ou toma dinheiro emprestado porque o empréstimo cria, ao mesmo tempo, um ativo e um passivo no seu balanço patrimonial: se você faz um empréstimo, recebe o dinheiro como um ativo, e a dívida correspondente se torna um passivo.

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Júlia começou sem ativos nem passivos, com um patrimônio líquido de zero, mas com base na sua renda futura esperada, ela conseguiu um empréstimo de $58 quando a taxa de juros era de 10% (ponto E na Figura 10.4). Nesse momento, seus ativos são os $58 em dinheiro que ela tem em mãos, enquanto seus passivos são o empréstimo que ela precisa pagar no futuro. Registramos o valor do empréstimo como $58 agora, já que isso é o que ela recebeu ao assumir a dívida (seus passivos aumentarão para $64 no futuro, assim que os juros tiverem sido acrescidos). É por isso que tomar o empréstimo não tem efeito sobre seu patrimônio líquido — os passivos e os ativos são iguais um ao outro, então o patrimônio líquido de Júlia permanece sendo zero. Na Figura 10.12, isso está registrado em seu balanço patrimonial sob o título de ”Agora (antes de consumir)”.

Júlia então consome os $58, os quais, para usar nossa analogia anterior, saem pelo ralo da banheira. Como ainda tem o passivo de $58, seu patrimônio líquido cai para −$58. Isso está registrado no balanço patrimonial da Figura 10.12 sob o título ”Agora (após consumir)”.

Depois, Júlia recebe $100 de renda (um fluxo para dentro da banheira). Além disso, por causa dos juros acumulados, o valor de seu empréstimo aumentou para $64. Portanto, o patrimônio líquido se torna $100 − $64 = $36. Novamente, assumimos que ela consume os $36, restando $64 em dinheiro para pagar sua dívida de $64. Nesse momento, seu patrimônio líquido cai para zero. O balanço patrimonial a que essas operações correspondem é mostrado na Figura 10.12.

Agora — antes de consumir

Ativos de Júlia Passivos de Júlia
Dinheiro $58 Empréstimo $58

Patrimônio líquido = $58 − $58 = $0

Agora — após consumir

Ativos de Júlia Passivos de Júlia
Dinheiro 0 Empréstimo $58

Patrimônio líquido = −$58

Depois — antes de consumir

Ativos de Júlia Passivos de Júlia
Dinheiro $100 Empréstimo $64

Patrimônio líquido = $100 − $64 = $36

Depois — após consumir

Ativos de Júlia Passivos de Júlia
Dinheiro $64 Empréstimo $64

Patrimônio líquido = 0

Figura 10.12 Balanço patrimonial de Júlia.

Questão 10.7 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

O diagrama a seguir mostra as escolhas de consumo de Júlia nos períodos 1 (presente) e 2 (no futuro) quando a taxa de juros é de 78%. Ela não tem renda um período 1, e tem $100 de renda no período 2. Ela escolhe o consumo G. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações a respeito do balanço de Júlia está(ão) correta(s)?

Tela inteira
  • No período 1, o ativo após o empréstimo, mas antes do consumo, é 56.
  • No período 1,o valor líquido após o consumo é 0.
  • No período 2, o passivo antes do consumo é 35.
  • No período 2, o ativo após o consumo, mas antes do pagamento doempréstimo, é 62.
  • No período 1, o ativo após o empréstimo, mas antes do consumo, é 35.
  • O valor líquido após o consumo no período 1 é –35, o valor que Júlia tomou emprestado.
  • No período 2, o passivo antes do consumo é 62, que é o valor do principal mais os juros do empréstimo de 35 no período 1.
  • Sua renda no período 2 é 100, dos quais ela consome 38, restando 62 antes de pagar o empréstimo.

10.8 Bancos, moeda e o banco central

Entre os credores de Chambar, a lucratividade dos seus negócios depende de:

  • custo do empréstimo tomado
  • taxa de inadimplência dos empréstimos concedidos aos fazendeiros
  • taxa de juros estabelecida

O fechamento dos bancos irlandeses por seis meses revelou como o dinheiro pode ser criado numa economia e como depende da confiança.

Esses estudos de casos e o modelo de dois períodos fornecem muito do que precisamos para entender o papel do sistema financeiro na economia. Entretanto, precisamos introduzir outros dois atores no cenário econômico: os bancos e o banco central.

banco
Uma firma que cria moeda na forma de depósitos bancários no processo de oferta de crédito.

Um banco é uma firma que gera lucro ao conceder e tomar empréstimos. Os termos nos quais os bancos emprestam às famílias e às firmas diferem dos termos nos quais tomam emprestado. Os juros que pagam sobre os depósitos são mais baixos do que os juros que cobram quando fazem empréstimos, o que lhes permite ter lucro.

Para explicar esse processo, primeiramente, temos que explorar em detalhes o conceito de moeda.

Tipos de moeda

A moeda pode assumir a forma de cédulas bancárias, depósitos bancários ou qualquer coisa com que se faça compras.

  • Base monetária: dinheiro nas mãos de famílias, firmas e bancos, e saldos mantidos por bancos comerciais em suas contas no banco central, conhecidos como reservas. Base monetária é o passivo do banco central.
  • Moeda escritural: dinheiro em forma de depósitos bancários criados por bancos comerciais quando concedem crédito a firmas e famílias. Moeda escritural é o passivo dos bancos comerciais.
  • Base monetária ampliada: a quantidade de moeda ampla na economia é medida pela quantidade de dinheiro em circulação. Esta última é definida como a soma de moeda escritural e da base monetária que está nas mãos do público que não faz parte do setor bancário.
banco central
O único banco que pode criar base monetária. Geralmente, faz parte do setor público. Bancos comerciais têm contas neste banco, nas quais a base monetária é depositada.

Vimos que qualquer coisa que seja aceita como pagamento pode ser considerada moeda. Porém, moeda nesse sentido é diferente da moeda corrente, que também é chamada de base monetária ou moeda de curso forçado. Diferente dos depósitos bancários ou cheques, a moeda corrente, por lei, deve ser aceita como pagamento. A moeda corrente inclui dinheiro (cédulas e moedas) e contas mantidas pelos bancos comerciais no banco central, chamadas de reservas dos bancos comerciais. As reservas são equivalentes a dinheiro porque um banco comercial sempre pode retirar reservas em dinheiro do banco central, e o banco central sempre pode imprimir qualquer quantidade de moeda que necessitar. Como veremos, esse não é o caso com as contas mantidas por famílias ou empresas em bancos comerciais — os bancos comerciais não têm necessariamente dinheiro disponível para satisfazer todas as necessidades dos seus clientes.

Muito do que consideramos moeda não é moeda corrente emitida pelo banco central, mas, na verdade, é criada por bancos comerciais quando fazem empréstimos. Explicaremos isso usando balanços patrimoniais.

Nosso hipotético Banco Abacus não está ligado ao Abacus Federal Savings Bank da vida real, que teve um papel interessante na crise financeira de 2008.

Diferente do nosso exemplo anterior no qual um depósito bancário surge de um empréstimo, nesse caso vamos supor que Marco tenha $100 em dinheiro e coloque esse valor em uma conta bancária no Banco Abacus. O Banco Abacus vai colocar o dinheiro em um cofre ou depositá-lo em suas contas no banco central. O balanço patrimonial do Banco Abacus ganha $100 de base monetária como ativo, e um passivo de $100 que é pagável a Marco quando demandado por ele, como mostramos na Figura 10.13a.

Ativos do Banco Abacus Passivos do Banco Abacus
Base monetária $100 Pagável a Marco quando demandado $100

Figura 10.13a Marco deposita $100 no Banco Abacus.

Marco quer pagar $20 para o dono da mercearia, Gino, em troca de mantimentos que comprou, então autoriza o Banco Abacus a transferir dinheiro para a conta de Gino no Banco Bonus (ele poderia fazer isso pagando Gino com cartão de débito). Isso está representado no balanço patrimonial dos dois bancos na Figura 10.13b. Os ativos e os passivos do Banco Abacus são reduzidos em $20, enquanto que os ativos do Banco Bonus aumentam em $20 adicionais de base monetária, e seus passivos aumentam em $20 pagáveis a Gino quando demandado por ele.

Ativos do Banco Abacus Passivo do Banco Abacus
Base monetária $80 Pagável a Marco quando demandado $80
Ativos do Banco Bonus Passivos do Banco Bonus
Base monetária $20 Pagável a Gino quando demandado $20

Figura 10.13b Marco paga $20 a Gino.

Isso ilustra os serviços de pagamentos oferecidos pelos bancos. Até aqui, consideramos apenas as transações que utilizam base monetária ou moeda corrente. Agora mostraremos como os bancos criam moeda no processo de conceder empréstimos.

Suponha que Gino tome $100 emprestados do Banco Bonus. O Banco Bonus empresta o dinheiro creditando os $100 na sua conta corrente, então agora o banco deve $120 a Gino, o qual, por sua vez, tem uma dívida de $100 com o banco. Assim, o balanço patrimonial do Banco Bonus se expandiu. Seus ativos cresceram em $100 emprestados a Gino, e seus passivos aumentaram nos $100 creditados na conta bancária de Gino, mostrados na Figura 10.13c.

Ativos do Banco Bonus Passivos do Banco Bonus
Base monetária $20 Pagável a Gino quando demandado $120
Empréstimo bancário: $100
Total $120

Figura 10.13c Banco Bonus empresta $100 a Gino.

Agora o Banco Bonus expandiu a oferta de moeda: Gino pode fazer pagamentos de até $120, então, dessa forma, a oferta de moeda cresceu em $100 — embora a base monetária não tenha crescido. A moeda criada por este banco é chamada de moeda escritural.

No entanto, a base monetária continua sendo essencial, em parte porque os clientes às vezes sacam dinheiro, mas também porque, quando Gino quiser gastar seu empréstimo, o banco terá que transferir base monetária. Suponha que Gino empregue Marco para trabalhar na sua loja e lhe pague $10. O Banco Bonus então tem que transferir $10 de base monetária da conta de Gino para a conta de Marco no Banco Abacus. Essa transação é mostrada na Figura 10.13d.

Ativos do Banco Abacus Passivo do Banco Abacus
Base monetária $90 Pagável a Marco quando demandado $90
Ativos do Banco Bonus Passivos do Banco Bonus
Base monetária $10 Pagável a Gino quando demandado $110
Empréstimo bancário $100
Total $110

Figura 10.13d Gino paga $10 a Marco.

Na prática, os bancos fazem muitas transações uns com os outros em um dia, a maioria delas cancelando uma à outra e, ao final de cada dia, são pagos os saldos das contas. Assim, no final do dia, cada banco transfere ou recebe o valor líquido das transações que fez. Isso significa que eles não precisam ter moeda corrente disponível para cobrir todas as transações ou demandas de dinheiro.

Observe que, se Marco e Gino fossem clientes do mesmo banco, não haveria perda de base monetária. Essa é uma razão pela qual os bancos lutam para ter uma maior parcela dos depósitos feitos no mercado.

Por causa dos empréstimos, a ”moeda” total no sistema bancário cresceu, como mostra a Figura 10.13e.

Ativos do Banco Abacus e do Banco Bonus Passivos do Banco Abacus e do Banco Bonus
Base monetária $100 Pagável quando demandado $200
Empréstimo bancário $100
Total $200

Figura 10.13e A ”moeda” total no sistema bancário cresceu.

Criar moeda pode parecer uma maneira fácil de obter lucros, mas o dinheiro que os bancos criam é um passivo, não um ativo, pois tem que ser pago aos que receberam o empréstimo quando eles o quiserem. O crédito correspondente é um ativo para o banco. Bancos obtêm lucros com esse processo ao cobrarem juros sobre os empréstimos. Assim, se o Banco Bonus empresta $100 a Gino a uma taxa de juros de 10%, no próximo ano, os passivos do banco terão se reduzido em $10 (os juros pagos sobre o empréstimo, que representam uma redução nos depósitos de Gino). Para o banco, essa renda aumenta os lucros acumulados e, portanto, seu patrimônio líquido, em $10. Como o patrimônio líquido é igual ao valor dos ativos menos o valor dos passivos, essas operações permitem que os bancos criem um patrimônio líquido positivo.

base monetária ampla
Estoque de moeda em circulação, definido como a soma da moeda escritural com a base monetária nas mãos do público que não está inserido no sistema bancário. Também conhecido como: oferta ampla de moeda, moeda ampla. Ver também: moeda escritural.

A base monetária (excluindo a moeda corrente nas mãos dos bancos) mais a moeda escritural é chamada de base monetária ampla. A moeda ampla é a moeda nas mãos do público que não está inserido no setor bancário.

A razão da base monetária sobre a moeda ampla varia entre os países e com o tempo. Por exemplo, antes da crise financeira, a base monetária consistia em 3-4% da moeda ampla no Reino Unido, 6-8% na África do Sul e 8-10% na China.

transformação de vencimentos
Prática de tomar dinheiro emprestado a curto prazo e emprestar a longo prazo. Por exemplo, um banco aceita depósitos, que promete devolver a curto prazo ou sem aviso prévio assim que solicitado, e faz empréstimos de longo prazo (que podem ser pagos ao longo de muitos anos). Também conhecido como: alteração de liquidez.
financiamento imobiliário
Empréstimo contraído por famílias e empresas para adquirir uma propriedade sem pagar o valor total de uma só vez. Ao longo de um período de muitos anos, o devedor paga o empréstimo com juros. O pagamento da dívida é assegurado pela própria propriedade, denominada garantia. Veja também: garantia.
risco de liquidez
Risco de que um ativo não possa ser trocado por dinheiro rápido o suficiente para evitar uma perda financeira.
risco de inadimplência
Risco de que o crédito fornecido como empréstimo não será pago.

Ao receber depósitos e conceder empréstimos, os bancos ofertam o serviço de transformação de vencimentos à economia. Os depositantes (pessoas e firmas) podem retirar seu dinheiro do banco sem aviso prévio. Por outro lado, quando os bancos emprestam, determinam uma data fixa para o pagamento do empréstimo, a qual, no caso de um financiamento imobiliário pode ser de 30 anos. Os bancos não podem exigir que o devedor pague antes. Isso permite que quem recebe empréstimos bancários faça um planejamento financeiro de longo prazo. Isso é chamado de transformação de vencimentos porque a duração de um empréstimo é denominada período de vencimento e, nesse caso, o banco está tomando emprestado a curto prazo e concedendo empréstimos a longo prazo. Esta prática também é chamada de transformação de liquidez: os depósitos dos credores são líquidos (livres para fluir de dentro para fora do banco quando demandado pelos depositantes), enquanto os empréstimos bancários para devedores não têm liquidez.

Embora seja um serviço essencial em qualquer economia, a transformação de vencimentos também expõe o banco a uma nova forma de risco (chamada risco de liquidez), que se soma à possibilidade de que seus empréstimos não sejam pagos (chamada risco de inadimplência).

corrida bancária
Situação em que os depositantes retiram recursos de um banco porque temem que ele vá à falência e não honre suas obrigações (ou seja, que não pague o que deve aos seus depositantes).

Os bancos criam dinheiro emprestando muito mais do que possuem em moeda corrente porque confiam que os depositantes não precisam de todos os seus recursos ao mesmo tempo. O risco que enfrentam é que todos os depositantes decidam retirar o dinheiro instantaneamente sem que dinheiro suficiente esteja lá. Na Figura 10.13e, o sistema bancário deve $200 mas tem apenas $100 de base monetária. Se todos os clientes pedissem seu dinheiro de uma só vez, os bancos não conseguiriam pagar: é o que se chama de corrida bancária. Se houver uma corrida, os bancos terão um problema. O risco de liquidez é uma causa de quebras de bancos.

Quando as pessoas temem que um banco esteja com escassez de liquidez, ocorre uma corrida para ser o primeiro a sacar os depósitos. Se todo mundo tentar sacar seus depósitos de uma vez, o banco não vai conseguir cumprir com todas as solicitações porque fez empréstimos de longo prazo que não podem ser resgatados imediatamente, como explica este artigo da revista The Economist.

Como qualquer outra firma em um sistema capitalista, os bancos também podem falir por fazerem investimentos ruins, tais como conceder empréstimos que não são pagos. Porém, em alguns casos, os bancos são tão grandes ou estão tão profundamente integrados ao sistema financeiro que os governos decidem resgatá-los se correrem risco de quebrar. Isso se explica porque, diferente da falência de uma firma, uma crise bancária pode derrubar o sistema financeiro como um todo e ameaçar os meios de subsistência de pessoas em toda a economia. No Capítulo 17, vamos ver como as falências bancárias se relacionaram à crise financeira global de 2008.

Questão 10.8 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Moeda é o dinheiro (moedas e cédulas) usado como meio de troca para compra de bens e serviços.
  • Moeda escritural é o total de moeda nas contas de depósitos dos poupadores no banco.
  • Base monetária é a oferta ampla de moeda menos a moeda escritural.
  • A transformação de liquidez ocorre quando os bancos transformam depósitos sem liquidez em empréstimos com liquidez.
  • Moeda é um meio de troca usado para comprar bens e serviços, mas pode assumir a forma de cheques e crédito assim como de moedas e cédulas.
  • Moeda escritural é dinheiro criado por bancos comerciais quando concedem crédito a firmas e famílias.
  • A oferta ampla de moeda é a base monetária criada pelo banco central mais a moeda escritural criada pelos bancos comerciais.
  • A transformação de liquidez ocorre quando os bancos transformam depósitos com liquidez em empréstimos sem liquidez.

10.9 O banco central, o mercado monetário e a taxa de juros

taxa de juros (curto prazo)
Preço de tomar emprestado da base monetária.

Os bancos comerciais lucram ao fornecer serviços bancários e empréstimos. Para manter o negócio, precisam ser capazes de fazer transações para as quais precisam de dinheiro da base monetária. Não existe uma relação automática entre a quantidade de dinheiro da base monetária de que precisam e a quantidade de empréstimos que concedem. Ao invés disso, os bancos precisam de qualquer quantidade de base monetária que cubra as transações líquidas que precisam fazer diariamente. O preço de tomar emprestado da base monetária é a taxa de juros no curto prazo.

No exemplo anterior, suponha que Gino queira pagar $50 a Marco (e não existam outras transações naquele dia). O banco de Gino, o Banco Bonus, não tem base monetária suficiente para fazer a transferência para o Banco Abacus, como podemos ver no balanço patrimonial da Figura 10.13f.

Ativos do Banco Bonus Passivos do Banco Bonus
Base monetária $20 Pagável a Gino quando demandado $120
Empréstimo bancário $100
Total $120

Figura 10.13f O Banco Bonus não tem base monetária suficiente para pagar $50 para ao Banco Abacus.

Sendo assim, o Banco Bonus precisa tomar um empréstimo de $30 de base monetária para fazer o pagamento. Os bancos emprestam um para o outro no mercado monetário, pois, a qualquer momento, alguns bancos terão moeda em excesso nas suas contas bancárias, e outros não terão suficiente. Eles poderiam tentar induzir alguém a depositar recursos adicionais em outra conta bancária, mas os depósitos também têm custos devido ao pagamento de juros, de marketing e da manutenção das filiais dos bancos. Assim, os depósitos em dinheiro são apenas uma parte do financiamento dos bancos.

Mas o que determina o preço de empréstimo no mercado monetário (a taxa de juros)? Podemos pensar em termos de oferta e demanda:

  • A demanda por base monetária depende de quantas transações os bancos comerciais precisam fazer.

  • A oferta de base monetária é simplesmente uma decisão do banco central.

Como o banco central controla a oferta de base monetária, também pode determinar a taxa de juros. O banco central intervém no mercado monetário ao declarar que emprestará qualquer quantidade demandada de base monetária a uma taxa de juros (i) que o próprio banco central escolheu.

Os detalhes técnicos de como o banco central implementa a política de taxa de juros escolhida varia entre os bancos centrais ao redor do mundo. Os detalhes podem ser encontrados nos sites de cada banco central.

taxa (básica) de juros
Taxa de juros estabelecida pelo banco central, que se aplica aos bancos que tomam empréstimos de base monetária um do outro e do banco central. Também conhecida como: taxa oficial de juros. Veja também: taxa de juros real, taxa de juros nominal.

Os bancos que operam no mercado monetário vão respeitar esse preço: nenhum banco vai tomar um empréstimo a uma taxa mais alta ou emprestar a uma taxa mais baixa, pois essas operações podem ser feitas junto ao banco central a uma taxa i . Este i também é chamado de taxa básica de juros ou taxa oficial.

taxa de empréstimo (bancário)
Taxa de juros média cobrada de firmas e famílias pelos bancos comerciais. Normalmente é superior à taxa básica de juros: a diferença entre essas taxas é a margem de lucro ou spread dos empréstimos comerciais. Também conhecida como: taxa de juros bancária, taxa de juros de mercado. Veja também: taxa de juros, taxa básica de juros.

A taxa básica de juros se aplica aos bancos que tomam empréstimos da base monetária um do outro e do banco central, mas é importante para o restante da economia devido ao seu efeito indireto sobre outras taxas de juros. A taxa de juros média que os bancos comerciais cobram de firmas e famílias é chamada de taxa de empréstimo. Esta taxa normalmente é superior à taxa básica de juros, o que garante que os bancos obtenham lucro (também será mais alta para tomadores de empréstimo considerados de risco pelos bancos, como vimos anteriormente). A diferença entre a taxa de empréstimo dos bancos e a taxa básica é a margem de lucro ou spread dos empréstimos comerciais.

No Reino Unido, por exemplo, a taxa básica de juros estabelecida pelo Banco da Inglaterra era de 0,5% em 2014, mas poucos bancos emprestariam a menos de 3%. Em economias emergentes, esta diferença pode ser bem grande devido à incerteza do ambiente econômico. No Brasil, por exemplo, a taxa de juros do banco central em 2014 era 11%, mas a taxa de empréstimo dos bancos era 32%.

O banco central não controla o markup, mas geralmente a taxa de empréstimo bancário sobe e desce de acordo com a taxa básica, exatamente como outras firmas normalmente ajustam os preços de acordo com seus custos.

títulos públicos
Instrumento financeiro emitido pelo governo que promete pagar fluxos de dinheiro a intervalos específicos.
rendimento da dívida pública
Taxa de retorno implícita que o comprador obtém sobre seu dinheiro quando compra um título da dívida pública a preço de mercado.
valor presente
Valor hoje de um fluxo de renda futura ou outro benefício, quando é descontado usando uma taxa de juros ou a taxa de desconto da própria pessoa. Veja também: valor presente líquido.

A Figura 10.14 simplifica bastante o sistema financeiro. Neste modelo, os poupadores têm apenas duas escolhas: depositar dinheiro em uma conta corrente em um banco, o que assumimos que não paga juros, ou comprar títulos da dívida pública no mercado monetário. A taxa de juros sobre os títulos da dívida pública é chamada de rendimento da dívida pública (ou soberana)(yield, em inglês). Leia o Einstein ao final desta seção para uma explicação sobre esses títulos e sobre por que o rendimento dos títulos da dívida pública se aproxima da taxa básica de juros. Também explicamos o chamado cálculo do valor presente essencial para que você entenda como os ativos, assim como os títulos, são precificados.

Tela inteira

Figura 10.14 Os bancos, o banco central, os tomadores de empréstimo e os poupadores.

Adaptado da Figura 5.12 no Capítulo 5 de Wendey Carlin e David Soskice. 2015. Macroeconomics: Institutions, Instability, and the Financial System. Oxford: Oxford University Press.

Aqui vemos um modelo de como o banco central estabelece a política de taxa de juros e como ela afeta as taxas de juros de empréstimos. Mas, por que o banco central deve estabelecê-la? Para entender o papel do banco central, precisamos observar duas questões:

  • Como a taxa de empréstimo afeta os gastos na economia? Vamos responder a essa questão na Seção 10.11.
  • Por que o banco central deseja influenciar os gastos alterando a taxa de juros (como mencionado na Figura 10.14)? Vamos responder a essa questão bem maior nos Capítulos 13 a 15, quando explicarmos as flutuações no emprego e na inflação da economia como um todo, e as razões pelas quais os bancos centrais frequentemente têm a responsabilidade de moderar essas flutuações alterando as taxas de juros.

Exercício 10.5 Markup das taxas de juros

Utilize o site de dois bancos centrais de sua escolha para coletar dados sobre a taxa básica de juros mensal e a taxa de juros dos financiamentos imobiliários entre 2000 e o ano mais recente disponível.

  1. Represente os dados em um gráfico, com a data no eixo horizontal e a taxa de juros no eixo vertical.
  2. Compare o markup dos bancos (margem da taxa de juros) entre esses dois países.
  3. O markup dos bancos varia ao longo do tempo? Sugira possíveis explicações para o que você observar.
arbitragem
Prática de comprar um bem a um preço baixo em um mercado para vendê-lo a um preço mais alto em outro. Os operadores de mercado que fazem a arbitragem tiram vantagem da diferença de preços de um mesmo bem entre dois países ou regiões. Enquanto os custos de comércio estiverem abaixo da diferença de preços, eles lucram. Veja também: diferencial de preços.

Einstein Valor presente (VP)

Ativos como ações de empresas, empréstimos bancários ou títulos geralmente fornecem um fluxo de renda no futuro. Como esses ativos são comprados e vendidos, temos que perguntar: como precificamos um fluxo de pagamentos futuros? A resposta é o valor presente (VP) da renda futura esperada.

Para fazer esse cálculo, assumimos que as pessoas que participam do mercado de compra e venda de ativos têm capacidade de poupar ou tomar empréstimos a determinada taxa de juros. Sendo assim, imagine que você está sujeito a uma taxa de juros de 6% e lhe oferecem um contrato financeiro que pagará €100 em um ano. Esse contrato é um ativo. Quanto você estaria disposto a pagar por ele hoje?

Você não pagaria €100 pelo contrato hoje, porque, se tivesse €100 hoje, poderia colocá-los no banco e ter €106 daqui a um ano, o que seria melhor do que comprar o ativo.

Imagine que lhe ofereçam o ativo por €90 hoje. Agora você pode querer comprá-lo, pois pode tomar €90 emprestados do banco a 6% hoje e pagar €95,40 daqui a um ano, enquanto recebe €100 pelo ativo, obtendo um lucro de €4,60.

O preço de equilíbrio (PE) (em inglês, break-even price) para esse contrato é aquele no qual você estaria indiferente entre comprar ou não o contrato: deve ser igual a qualquer quantia de dinheiro que lhe proporcionaria €100 em um ano se você o colocasse no banco. Com uma taxa de juros de 6%, esse valor seria:

\[\begin{align*} \text{PV} = \frac{100}{1+6\%} = \frac{100}{1,06} = 94,34 \end{align*}\]

Para você, €94,34 hoje valem o mesmo que os €100 daqui a um ano, porque se você colocasse €94,34 no banco, este valor geraria €100 em um ano. Da mesma forma, se você tomasse €94,34 emprestados do banco para comprar o ativo hoje, teria que pagar €100 em um ano, exatamente o que o ativo lhe renderia.

Dizemos que a renda no próximo ano deve ser descontada pela taxa de juros: uma taxa de juros positiva faz com que a renda futura valha menos do que a renda atual.

A mesma lógica se aplica ao futuro mais distante, quando permitimos que os juros se acumulem ao longo do tempo. Se você for receber €100 em t anos, então esse valor para você hoje é de:

\[\begin{align*} \text{PV} = \frac{100}{1,06^t} \end{align*}\]

Suponha agora que um ativo remunere ano a ano durante T anos, pagando Xt no ano t, a começar ano que vem, no ano 1. Então, cada pagamento Xt precisa ser descontado de acordo com quão distante está no futuro. Assim, com uma taxa de juros de i, o VP deste ativo é:

\[\begin{align*} \text{PV} = \frac{X_1}{(1+i)^1} + \frac{X_2}{(1+i)^2} + … + \frac{X_T}{(1+i)^T} \end{align*}\]

O valor presente desses pagamentos obviamente depende da quantidade de pagamentos, mas depende também da taxa de juros: se esta aumenta, o VP se reduz, porque os pagamentos futuros são mais descontados (seu VP é reduzido). Observe que é fácil ajustar a fórmula do valor presente para considerar taxas de juros diferentes para 1, 2 ou mais anos.

Valor presente líquido (VPL)

Essa lógica se aplica a qualquer ativo que gere renda no futuro. Logo, se uma firma estiver considerando se faz ou não um investimento, tem que comparar o custo de fazê-lo com o valor presente dos lucros que espera obter no futuro com este investimento. Nesse contexto, consideramos o valor presente líquido (VPL), que considera tanto o custo de fazer o investimento quanto os lucros esperados. Se o custo for c e o valor presente dos lucros esperado for VP, então o VLP de fazer o investimento será:

\[\begin{align*} \text{NPV} = \text{PV} - c \end{align*}\]

Se for positivo, então vale a pena fazer o investimento, pois os lucros esperados valem mais que o custo (e vice-versa).

Preços de títulos e rendimentos

Um título é um tipo particular de ativo financeiro cujo emissor promete pagar determinada quantia ao comprador do título ao longo de um período. Emitir ou vender um título equivale a fazer um empréstimo, porque o emissor do título recebe dinheiro hoje e promete pagá-lo no futuro. Inversamente, o comprador do título é o credor ou poupador, porque entrega dinheiro hoje esperando receber no futuro. Tanto o governo quanto as firmas tomam empréstimos emitindo títulos. As famílias compram títulos como forma de poupar tanto direta quanto indiretamente por meio dos fundos de pensão.

Normalmente os títulos duram um tempo predefinido, chamado de vencimento do título, e oferecem duas formas de pagamento: o valor de face F, que é uma quantia paga quando o título vence, e um pagamento fixo a cada período (por exemplo, a cada ano ou a cada 3 meses) até o vencimento. No passado, os títulos eram papéis físicos com cupons recortáveis: quando um dos pagamentos fixos era resgatado, um cupom era recortado do título. Por essa razão, os pagamentos fixos são chamados de cupons e serão designados pela letra C.

Como vimos ao calcular o VP, a quantia que um credor estará disposto a pagar pelo título será seu valor presente, que depende do valor de face do título, da série de cupons a serem pagos e também da taxa de juros. Ninguém vai comprar um título por um preço maior do que o seu valor presente porque estaria em melhor situação se colocasse seu dinheiro no banco. Ninguém vai vender um título por um preço menor do que o seu valor presente porque estaria em melhor situação se tomasse um empréstimo no banco. Então:

\[\begin{align*} \text{preço do título} &= \text{valor presente do fluxo de cupons descontado} \\ &\hspace{1em}+ \text{valor presente descontado}\\ &\hspace{2.3em}\text{do valor de face no vencimento} \end{align*}\]

Ou, para um título com vencimento em T anos:

\[\begin{align*} P = \underbrace{\frac{C}{(1+i)^1} + \frac{C}{(1+i)^2} + … + \frac{C}{(1+i)^T}}_\text{cupons} + \underbrace{\frac{F}{(1+i)^T}}_\text{valor de face} \end{align*}\]

Uma característica importante de um título é o seu rendimento. Essa é a taxa de retorno implícita que o comprador obtém por seu dinheiro quando compra um título ao preço de mercado. Calculamos o rendimento usando uma equação como a de VP. O rendimento y resolve a seguinte equação:

\[\begin{align*} P = \underbrace{\frac{C}{(1+y)^1} + \frac{C}{(1+y)^2} + … + \frac{C}{(1+y)^T}}_\text{cupons} + \underbrace{\frac{F}{(1+y)^T}}_\text{valor de face} \end{align*}\]

Se a taxa de juros permanece constante, como estamos assumindo, então o rendimento será o mesmo que a taxa de juros. Entretanto, na verdade, não podemos ter certeza de como a taxa de juros vai variar ao longo do tempo. Por outro lado, conhecemos o preço do título, o pagamento de seus cupons e seu valor de face, assim, sempre é possível calcular seu rendimento. Comprar um título com rendimento y equivale a poupar seu dinheiro a uma taxa de juros constante garantida de i = y.

Uma vez que um poupador (que é um credor) pode escolher entre comprar um título da dívida pública, emprestar o dinheiro no mercado monetário ou colocá-lo em uma conta bancária, o rendimento dos títulos da dívida pública será muito próximo da taxa de juros no mercado monetário. Se não fosse, os financistas (traders, em inglês) rapidamente trocariam o dinheiro de um ativo para outro até que as taxas de retorno se igualassem, estratégia chamada de arbitragem.

Vejamos um exemplo numérico: um título da dívida pública tem valor de face de €100, paga um cupom anual de €5 e vence em 4 anos. A taxa de juros nominal no mercado monetário é de 3% e é usada para descontar o fluxo de pagamentos que recebemos.

Portanto, o preço do título é dado por:

\[\begin{align*} P &= \frac{5}{(1,03)^1} + \frac{5}{(1,03)^2} + \frac{5}{(1,03)^3} + \frac{5}{(1,03)^4} + \frac{100}{(1,03)^4} \\ &= 4,85 + 4,71 + 4,58 + 4,44 + 88,85 \\ &= 107,43 \end{align*}\]

Estaríamos dispostos a pagar no máximo €107,43 por este título hoje, mesmo que gerasse €120 de receita em quatro anos. O rendimento é igual à taxa de juros de 3%. Se o banco central aumenta sua taxa básica de juros, isso irá reduzir o preço de mercado do título, aumentando o rendimento junto com a taxa de juros.

10.10 A atividade bancária e os balanços patrimoniais dos bancos

Para entender mais detalhadamente a atividade bancária, podemos analisar os custos e as receitas dos bancos:

  • Custos operacionais dos bancos: incluem os custos administrativos de fazer empréstimos. Por exemplo, os salários dos funcionários da área de financiamentos que avaliam as solicitações de empréstimos, os custos de alugar e manter uma rede de filiais e call centers usados para fornecer serviços bancários.
  • Custos de juros bancários: os bancos devem pagar juros sobre seus passivos, inclusive depósitos e outros empréstimos.
  • Receitas dos bancos: são os juros e pagamentos sobre os empréstimos concedidos aos seus clientes.
  • Retorno esperado pelos bancos: retorno sobre os empréstimos concedidos, considerando o fato de que nem todos os clientes pagarão o que devem.

Como ocorre no caso dos credores, se o risco de conceder empréstimos (a taxa de inadimplência) for alta, haverá uma diferença maior (spread ou markup) entre a taxa de juros que os bancos cobram pelos empréstimos que concedem e o custo dos empréstimos tomados.

A lucratividade do negócio depende da diferença entre o custo de tomar empréstimo e o retorno por emprestar, levando-se em consideração a taxa de inadimplência e os custos operacionais de selecionar os empréstimos e administrar o banco.

Uma boa forma de entender um banco é analisar todo o seu balanço patrimonial, que resume sua atividade principal: conceder e tomar empréstimos para obter lucro:

  • Os empréstimos que os bancos tomam estão no passivo: depósitos e empréstimos assumidos (com ou sem garantia) são registrados como passivos.
  • Os empréstimos que os bancos concedem estão no ativo.
Ativos (pertencentes ou devidos ao banco) % do balanço patrimonial Passivos (o que o banco deve para famílias, firmas e outros bancos) % do balanço patrimonial
Saldo de reserva de moeda no banco central (A1) Propriedade do banco: recursos imediatamente acessíveis 2 Depósitos (P1) Propriedade de famílias e firmas 50
Ativos financeiros, alguns dos quais (títulos da dívida pública) podem ser usados como garantias em empréstimos) (A2) Propriedade do banco 30 Empréstimos garantidos (oferecem garantias) (P2) Incluem empréstimos tomados junto a outros bancos via mercado monetário 30
Empréstimos para outros bancos (A3) Via mercado monetário 11 Empréstimos não garantidos (não oferecem garantia) (P3) 16
Empréstimos para famílias (A4) 55
Ativos fixos, tais como prédios e equipamentos (A5) Propriedade do banco 2
Total de ativos 100 Total de passivos 96
Valor líquido = total de ativos − total de passivos = capital próprio (P4) 4

Figura 10.15 Balanço bancário simplificado.

Adaptado da Figura 5.9 no Capítulo 5 de Wendey Carlin e David Soskice. 2015. Macroeconomics: Institutions, Instability, and the Financial System. Oxford: Oxford University Press.

Como vimos acima:

\[\begin{align*} \text{patrimônio líquido} &\equiv \text{ativos − passivos} \end{align*}\]
insolvente
Uma entidade é insolvente se o valor dos seus ativos for menor do que o valor de seus passivos. Veja também: solvente.
liquidez
Facilidade de comprar ou vender um ativo financeiro a um preço previsível.

Outra forma de dizer isso é afirmar que o patrimônio líquido de uma firma, como um banco, é igual ao que deve ser pago aos acionistas ou proprietários. Isso explica por que o valor líquido está do lado dos passivos do balanço. Se o valor dos ativos do banco for menor do que sua dúvida junto a outros agentes, então seu patrimônio líquido será negativo e o banco estará insolvente.

Vamos analisar os ativos do balanço patrimonial do banco:

  • (A1) Dinheiro e reservas do banco central: o item A1 do balanço é o dinheiro que o banco possui mais o saldo de sua conta no banco central, chamado de saldo das reservas. Dinheiro e reservas no banco central são os recursos imediatamente acessíveis do banco, ou recursos líquidos. Essa é a base monetária e soma uma pequena fração do balanço patrimonial do banco: apenas 2% neste exemplo de um banco contemporâneo típico. Como vimos acima, o dinheiro criado pelo banco central é uma proporção muito pequena da oferta ampla de moeda que circula na economia.
  • (A2) Ativos financeiros do próprio banco: esses ativos podem ser usados como garantias para o banco tomar empréstimos no mercado monetário. Como discutimos acima, bancos tomam empréstimos para repor seus saldos de moeda (item A1, Figura 10.15) quando os depositantes retiram (ou transferem) mais recursos do que o banco tem disponível.
  • (A3) Empréstimos para outros bancos: um banco também terá empréstimos concedidos a outros bancos em seu balanço patrimonial.
  • (A4) Empréstimos para famílias e firmas: as atividades de empréstimo dos bancos são o maior item entre os ativos. Os empréstimos concedidos a famílias e firmas somam até 55% do balanço da Figura 10.15. Este é o principal negócio do banco. Uma parte deste item será de empréstimos garantidos. Um empréstimo é garantido se o devedor tiver fornecido uma garantia. No caso de financiamentos imobiliários, o valor da casa é uma garantia. Outros empréstimos bancários não têm garantia, como cheque especial, saldos de cartão de crédito e financiamentos a consumidores.
  • (A5) Ativos bancários tais como prédios e equipamentos são registrados no lado dos ativos do balanço.

No lado dos passivos do balanço patrimonial, existem três formas pelas quais o banco toma empréstimos, exibidas na Figura 10.15:

Author query: Please provide a definition for “capital próprio”.

capital próprio
Investimento do próprio indivíduo em um projeto. É registrado no balanço de um indivíduo ou firma como patrimônio líquido. Veja também: patrimônio líquido. Um uso totalmente diferente do termo é sinônimo de equidade.
patrimônio líquido
Ativos menos passivos. Veja também: balanço, capital próprio.
  • (P1) A mais importante é o depósito bancário, que soma até 50% do balanço patrimonial do banco neste exemplo. O banco deve esses depósitos para as famílias e firmas. Como parte da sua decisão de maximização de lucros, o banco faz uma previsão da demanda de retirada dos depósitos pelos depositantes. Em todo o sistema bancário, retiradas e depósitos ocorrem continuamente, e quando as transações entre bancos são compensadas, a maioria cancela uma à outra. Qualquer banco deve se assegurar de ter moeda e reservas no banco central para cumprir a demanda de recursos feita pelos depositantes e as transferências líquidas que fizeram naquele dia. Manter moeda e reservas para este fim tem um custo de oportunidade, pois, ao invés disso, esses recursos poderiam ser emprestados no mercado monetário a fim de gerar juros. Por isso os bancos buscam manter um saldo prudencial mínimo de moeda e reservas.
  • (P2) e (P3) do lado dos passivos do balanço são o que o banco tomou emprestado de famílias, firmas e outros bancos no mercado monetário. Parte disso é de empréstimos garantidos: o banco oferece garantias utilizando seus ativos financeiros (que estão no lado esquerdo do balanço, no item (P2)). Parte dos empréstimos não têm garantia.
  • (L4) do balanço é o patrimônio líquido do banco. Este é o capital próprio do banco (equity, em inglês), composto pelas ações emitidas pelo banco e pelos lucros acumulados, que não foram pagos como dividendos para os acionistas ao longo dos anos. Para um banco típico, o capital próprio é apenas uma pequena porcentagem do seu balanço patrimonial. O banco é uma empresa muito intensiva em endividamento.

Podemos verificar isso em exemplos da vida real, ilustrados pelas Figuras 10.16 e 10.17.

A Figura 10.16 mostra o balanço patrimonial simplificado do Banco Barclays (imediatamente antes da crise financeira) e a Figura 10.17 mostra o balanço simplificado de uma empresa que não pertence ao setor financeiro, a Honda.

Ativos Passivos
Saldo de reserva de moeda no banco central 7.345 Depósitos 336.316
Reserva de empréstimos de recompra no atacado 174.090 Empréstimos de recompra no atacado com garantias 136.956
Empréstimos (por exemplo, financiamentos imobiliários) 313.226 Empréstimo sem garantia 111.137
Ativos fixos (por exemplo: prédios, equipamentos) 2.492 Passivos da carteira de negociação 71.874
Ativos da carteira de negociação 177.867 Instrumentos financeiros derivativos 140.697
Instrumentos financeiros derivativos 138.353 Outros passivos 172.417
Outros ativos 183.414
Total de ativos 996.787 Total de passivos 969.397
Patrimônio líquido
Capital próprio 27.390
Item de memorando: Razão de alavancagem (ativos totais/patrimônio líquido) 996.787/27.390 = 36,4

Figura 10.16 Balanço patrimonial do Banco Barclays em 2006 (£m).

Banco Barclays. 2006. Relatório Anual Barclays Bank PLC. Também apresentado na Figura 5.10 do Capítulo 5 de Wendey Carlin e David Soskice. 2015. Macroeconomics: Institutions, Instability, and the Financial System. Oxford: Oxford University Press.

Ativos Passivo
Ativo circulante 5.323.053 Passivo circulante atuais 4.096.685
Financiamento de filiais recebível (líquido) 2.788.135 Dívida de longo prazo 2.710.845
Investimentos 668.790 Outros passivos 1.630.085
Imóveis operacionais arrendados 1.843.132
Propriedades, fábricas e equipamentos 2.399.530
Outros ativos 612.717
Total de ativos 13.635.357 Total de passivos 8.437.615
Patrimônio líquido
Capital próprio 5.197.742
Item de memorando: Razão de alavancagem definida para bancos (ativos totais/patrimônio líquido) 13.635.357/5.197.742 = 2,62
Item de memorando: Razão de alavancagem definida para instituições não bancárias (passivos totais/patrimônio líquido) 8.437.615/13.635.357 = 61,9%

Figura 10.17 Balanço patrimonial da Honda Motor Company em 2013 (¥m).

Honda Motor Co. 2013. Relatório Anual.

Ativo circulante se refere a dinheiro, estoques e outros ativos de curto prazo. Passivo circulante se refere a débitos de curto prazo e outros pagamentos pendentes.

razão de alavancagem (para bancos e famílias)
Valor dos ativos dividido pelo capital próprio investido nesses ativos.

Uma forma de descrever quão dependente de endividamento uma empresa está é verificando sua razão de alavancagem.

Infelizmente o termo razão de alavancagem é definido de forma diferente para empresas financeiras e não financeiras (as definições são mostradas nas Figuras 10.16 e 10.17). Aqui, calculamos a alavancagem para o Barclays e a Honda utilizando a definição usada para bancos: ativos totais divididos pelo patrimônio líquido. Os ativos totais do Barclays’ são 36 vezes o seu valor líquido. Isso significa que, dado o tamanho de seu passivo (suas dívidas), uma variação pequena no valor dos seus ativos (1/36 ≈ 3%) seria suficiente para consumir seu patrimônio líquido e tornar o banco insolvente. Por outro lado, utilizando a mesma definição, vemos que a alavancagem da Honda é menor do que três. Comparado com o Barclays, o capital próprio da Honda é muito maior em relação aos ativos da empresa. Outra forma de dizer isso é que a Honda financia seus ativos com uma combinação de dívida (62%) e capital próprio (38%), enquanto que o Barclays financia seus ativos com 97% de dívida e 3% do próprio capital.

Alavancagem para instituições não bancárias

É definida de forma diferente da alavancagem para bancos. Para as empresas, a razão de alavancagem é definida como o valor dos passivos totais dividido pelos ativos totais. Para ver um exemplo do uso da definição de alavancagem para instituições não bancárias, consulte: Marina-Eliza Spaliara. 2009. ‘Do Financial Factors Affect the Capital-labour Ratio? Evidence from UK Firm-Level Data’. Journal of Banking & Finance 33 (10) (October): pp. 1932–1947.

Questão 10.9 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

O exemplo a seguir é um balanço patrimonial simplificado de um banco comercial. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

Ativos Passivos
Moeda e reservas £2m Depósitos £45m
Ativos financeiros £27m Empréstimos com garantia £32m
Empréstimos para outros bancos £10m Empréstimos sem garantia £20m
Empréstimos para famílias e firmas £55m
Ativos fixos £6m
Total de ativos £100m Total de passivos £97m
  • A base monetária do banco consiste em moeda e reservas e em ativos financeiros.
  • Empréstimos com garantia são aqueles concedidos com risco zero de inadimplência.
  • O patrimônio líquido do banco consiste nos £2 milhões de moeda e reservas.
  • A alavancagem do banco é de 33,3.
  • A base monetária é igual a moeda mais as reservas no banco central, e não inclui os ativos financeiros.
  • Empréstimos com garantia são empréstimos feitos junto a outros bancos, utilizando os ativos financeiros como garantia. Seu risco de inadimplência é positivo (daí a garantia).
  • O patrimônio líquido do banco é dado por ativos – passivos = £3 milhões.
  • A alavancagem é o total de ativos dividido pelo patrimônio líquido, nesse caso, £100 milhões/£3 milhões = 33,3.

10.11 A taxa de juros do banco central pode afetar os gastos

As famílias e firmas tomam empréstimos para gastar: quanto maior o custo de fazer um empréstimo (ou seja, quanto maior a taxa de juros), menos famílias e firmas gastam no presente. Essa dinâmica permite que o banco central influencie a quantidade de gasto na economia, a qual afeta as decisões das firmas a respeito de quantas pessoas empregar e que preços cobrar. Dessa forma, o banco central pode afetar o nível de desemprego e de inflação (aumento de preços), como veremos em detalhes nos Capítulos 13 a 15.

Para ver o efeito de uma taxa de juros baixa sobre os gastos com consumo, voltamos a Júlia, que não tem riqueza, mas espera receber $100 daqui a um ano. Utilize a análise na Figura 10.18 para ver como a taxa de juros afeta sua decisão de quanto gastar agora.

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Figura 10.18 Taxas de juros e gasto com consumo.

Júlia não possui riqueza agora
:
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Júlia não possui riqueza agora

Ela espera receber $100 em um ano.

A taxa de juros dos credores
:
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A taxa de juros dos credores

A uma taxa de juros de 78%, Júlia tomou $35 emprestados de credores para gastar agora (ponto G).

Uma taxa de juros mais baixa
:
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Uma taxa de juros mais baixa

A uma taxa de juros de 10%, Júlia tomaria $58 emprestados e gastaria os $58 agora (ponto E).

À medida que a taxa de juros cai …
:
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À medida que a taxa de juros cai …

O painel do lado direito da figura traça os gastos de consumo de Júlia no presente à medida que a taxa de juros cai, com G e E correspondendo aos mesmos pontos no painel à esquerda.

A curva de demanda de Júlia
:
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A curva de demanda de Júlia

A linha inclinada para baixo é a demanda por empréstimos de Júlia, e representa também seus gastos no presente.

Em muitos países desenvolvidos, quando as pessoas tomam empréstimos, geralmente é para comprar um carro ou uma casa (financiamentos imobiliários são menos comuns em países com mercados financeiros menos desenvolvidos). Empréstimos com esses fins estão prontamente disponíveis mesmo para pessoas com riqueza limitada porque, diferentemente dos empréstimos para comprar alimentos ou para itens de consumo diário, financiamentos adquirem um carro ou uma casa que podem servir como garantias ao banco, protegendo-o contra o risco de inadimplência. Por essa razão, um dos canais mais importantes pelos quais a taxa de juros afeta o gasto doméstico em muitas economias desenvolvidas é por seus efeitos sobre a aquisição de casas e bens de consumo duráveis, tais como automóveis. As taxas de juros estabelecidas pelo banco central podem ajudar a moderar os altos e baixos nos gastos com o setor imobiliário e bens de consumo duráveis e, assim, suavizar as flutuações na economia como um todo.

Questão 10.10 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

O diagrama a seguir representa a escolha de consumo de Júlia nos períodos 1 (presente) e 2 (no futuro) sob diferentes taxas de juros. Ela não tem renda no período 1, mas tem no período 2, sobre a qual pode pedir um empréstimo. Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

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  • Um corte na taxa de juros aumenta a taxa marginal de transformação de consumo do período 2 para o período 1.
  • Sem dúvida, Júlia vai aumentar seu consumo no período 1 após um corte na taxa de juros.
  • Sem dúvida, Júlia vai aumentar seu consumo no período 2 após um corte na taxa de juros.
  • O gráfico de taxa de juros (eixo vertical) versus o consumo do período 1 (eixo horizontal) é uma curva inclinada para baixo.
  • A taxa marginal de transformação (TMT) é igual a um mais a taxa de juros. Então, a TMT diminui com um corte na taxa de juros.
  • Um corte na taxa de juros aumenta a renda de Júlia e também torna o consumo atual mais barato em relação ao consumo futuro. Logo, tanto o efeito renda quanto o efeito substituição a levam a aumentar o consumo no período 1.
  • O efeito substituição do corte da taxa vai fazer com que Júlia diminua seu consumo no período 2. O efeito renda do corte da taxa irá fazer com que ela diminua seu consumo no período 2. Portanto, o efeito líquido é ambíguo.
  • Na Figura 10.18, podemos ver que o consumo no período 1 aumenta à medida que a taxa de juros diminui. Por isso, o consumo no período 1 é decrescente em relação à taxa de juros, o que significa que o gráfico é uma curva inclinada para baixo.

Exercício 10.6 Taxa de juros e gasto com consumo

Considere os efeitos renda e substituição de um aumento da taxa de juros, conforme analisado nos Exercícios 10.2 e 10.3. Comente se o efeito esperado de um aumento na taxa de juros seria reduzir o gasto com consumo em uma economia na qual uma parcela das famílias é como Júlia, e outra é como Marco.

10.12 Restrições do mercado de crédito: um problema principal-agente

Conceder empréstimos é arriscado. Um empréstimo feito agora precisa ser pago no futuro. Entre presente e futuro, podem acontecer eventos imprevistos fora do controle do devedor. Se a colheita em Chambar, Paquistão, fosse destruída pelo mal tempo ou por pragas, os credores não seriam pagos mesmo que os agricultores tivessem trabalhado muito. A possível obsolescência das competências do curso em que você investiu seu financiamento estudantil é um risco inevitável, e implicaria que o empréstimo poderia não ser pago. A taxa de juros definida por um banco ou por um credor seria maior se o risco de inadimplência por eventos inevitáveis fosse maior.

Por outro lado, os credores enfrentam dois problemas adicionais. Quando os empréstimos são destinados a projetos de investimento, o credor não tem certeza de que o devedor se esforçará o suficiente para que o projeto seja bem-sucedido. Entretanto, geralmente o tomador tem mais informações do que o credor sobre a qualidade do projeto e sua probabilidade de sucesso. Ambos os problemas surgem da diferença entre a informação que tomador e credor têm a respeito do projeto e das ações do devedor.

relação principal-agente
Esse relacionamento existe quando uma parte (o principal) gostaria que a outra (o agente) agisse de certa forma ou tivesse algum atributo de interesse do principal cujo cumprimento não pode ser exigido ou garantido por um contrato vinculante. Ver também: contrato incompleto. Também conhecido como: problema principal-agente.

Tudo isso cria um conflito de interesses. Se o projeto não for bem-sucedido porque o tomador não se esforçou muito, ou simplesmente porque não era um bom projeto, o credor perde dinheiro. Se o tomador estivesse usando apenas seu próprio dinheiro, provavelmente seria mais responsável ou talvez nem mesmo entrasse no projeto.

A relação entre credor e tomador é um problema principal-agente. O credor é o ”principal” e o tomador é o ”agente”. O problema principal-agente entre credor e devedor é semelhante ao problema do “dinheiro dos outros” discutido no Capítulo 6. Naquele caso, o gerente de uma firma (o agente) toma decisões a respeito do uso dos recursos fornecidos pelos investidores da firma (os principais), mas eles não estão em posição de exigir que o gerente aja de uma forma que maximize sua riqueza ao invés de buscar atingir seus próprios objetivos.

No caso de tomar ou conceder empréstimos, normalmente não é possível que o credor (o principal) faça um contrato garantindo que um empréstimo será pago pelo tomador (o agente). Assim, é impossível para o credor garantir por contrato que o tomador usará os recursos de uma forma prudente, que permita o pagamento dentro dos termos do empréstimo.

A tabela da Figura 10.19 compara dois problemas principal-agente.

Agentes Conflito de interesses sobre Contrato executável cobre Fora do contrato (ou não aplicável) Resultado
Mercado de trabalho (Capítulos 6 e 9) Empregador
Empregado
Salários, trabalho (qualidade e quantidade) Salários, tempo, condições Salário (qualidade e quantidade), duração do emprego Esforço abaixo do esperado, desemprego
Mercado de crédito (Capítulos 10 e 12) Credor
Tomador
Taxa de juros, condução do projeto (esforço, prudência) Taxa de juros Esforço, prudência, pagamento Alto risco, restrição do crédito

Figura 10.19 Problemas principal-agente: mercado de crédito e mercado de trabalho.

Author query: Please provide a definition for “capital próprio”.

Uma possível resposta do credor a esse conflito de interesses é exigir que o tomador coloque parte de sua riqueza no projeto (chamado de capital próprio). Quanto mais capital próprio o tomador tiver investido no projeto, mais seus interesses estarão alinhados com os do credor. Outra reação comum, seja entre os tomadores que buscam comprar casas na Nova Zelândia ou carros em Nova Orleans, é exigir que o tomador indique uma propriedade a ser transferida para o credor se o empréstimo não for pago (chamado de garantia).

Author query: Please provide a translation for the title of this video: “A video about car ignition disabling devices, required by lenders to be installed into cars purchased on loan.”

Incluir capital próprio ou garantias na negociação reduz o conflito de interesses entre tomador e credor. O motivo é que, quando o devedor tem um pouco do que é seu em jogo (seja capital próprio ou uma garantia):

  • É do seu interesse trabalhar com afinco: tentando tomar decisões profissionais mais prudentes para garantir o sucesso do projeto.
  • Esse é um sinal para o credor: sinaliza que o devedor pensa que o projeto tem qualidade suficiente para ser bem-sucedido.

Porém, aí tem um problema: se já for rico, o devedor pode tanto usar sua riqueza como garantia quanto colocar seu próprio capital no projeto, ou poderia até estar do outro lado do mercado, emprestando dinheiro. Geralmente, o motivo pelo qual o devedor precisa de um empréstimo é não possuir riqueza. Como resultado de não tê-la, pode não conseguir capital próprio ou garantias suficientes para reduzir o conflito de interesses e, portanto, o risco que o credor enfrenta. Por isso, o credor pode negar seu pedido de empréstimo.

excluídos do crédito
Descrição das pessoas que não conseguem tomar empréstimos em nenhuma circunstância. Veja também: restrição de crédito.
(pessoas com) restrição de crédito
Condição das pessoas que só conseguem tomar empréstimos em circunstâncias desfavoráveis. Veja também: excluídos do crédito.
racionamento de crédito
Processo pelo qual aqueles que possuem menos riqueza tomam empréstimos em condições menos favoráveis em comparação com os que têm mais riquezas.

Isso é conhecido como racionamento de crédito: aqueles que têm menos riqueza tomam empréstimos em condições desfavoráveis se comparadas com aquelas oferecidas a quem tem mais riqueza, ou então têm seus pedidos de empréstimo totalmente recusados.

Tomadores de empréstimo cuja riqueza limitada torna impossível conceder empréstimos a qualquer taxa de juros são denominados excluídos do crédito. Aqueles que tomam empréstimos, mas apenas em condições desfavoráveis, são denominados pessoas com restrições de crédito. Às vezes, ambos são chamados de pessoas com riqueza restrita, o que significa que suas riquezas limitam suas oportunidades no mercado de crédito. Adam Smith tinha o racionamento de crédito em mente quando escreveu:

Como diz o provérbio, dinheiro faz mais dinheiro. Quando se tem um pouco, geralmente é fácil conseguir mais. A grande dificuldade é conseguir esse pouco. (An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations, 1776).7

A relação entre riqueza e crédito é resumida na Figura 10.20.

Tela inteira

Figura 10.20 Riqueza, qualidade do projeto e crédito.

A exclusão daqueles que não possuem riqueza do mercado de crédito ou o acesso a crédito em condições desfavoráveis é evidente nos seguintes fatos:

  • Em uma pesquisa, uma a cada oito famílias americanas teve suas solicitações de crédito recusadas por uma instituição financeira: os ativos das famílias com restrição de crédito eram 63% menores do que os das famílias sem restrições. “Tomadores desalentados” (aqueles que não solicitaram empréstimos porque esperavam ser rejeitados) tinham ainda menos riqueza do que os que fizeram a solicitação.
  • Os limites de endividamento por cartão de crédito geralmente aumentam automaticamente: se o endividamento aumenta em resposta a uma mudança automática nos limites do cartão de crédito, podemos concluir que o indivíduo tinha restrições de crédito. Os autores desse estudo sugerem que aproximadamente dois-terços das famílias americanas podem ter restrições de crédito ou mesmo estarem excluídas de acessá-lo.8
  • A herança leva os profissionais liberais a aumentarem consideravelmente a escala de suas operações: uma herança de £5.000 em 1981 (cerca de $24.000 atualmente) duplica a probabilidade de um jovem britânico comum abrir um negócio.
  • Quem possui uma casa pode usá-la como garantia: um aumento de 10% no valor dos ativos imobiliários que poderiam ser usados como garantia para conseguir empréstimos no Reino Unido aumenta o número de startups em 5%.
  • Nos Estados Unidos, pessoas que não possuem muitos ativos geralmente fazem “empréstimos consignados” de curto prazo: no estado de Illinois, um devedor de curto prazo típico é uma mulher de baixa renda na faixa dos trinta e poucos anos ($24.104 de renda anual), que mora de aluguel, toma de $100 a $200 emprestados e paga, em média, 486% de taxa de juros anuais.
  • Agricultores indianos de baixa e média renda aumentariam consideravelmente suas rendas se não tivessem restrições de crédito: eles não apenas investem menos em ativos produtivos, mas também investem em ativos voltados para beneficiar aqueles que podem comprá-los em caso de necessidade (gado) em detrimento de equipamentos altamente lucrativos (bombas de irrigação), que têm pouco valor de revenda.9

Questão 10.11 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s) em relação ao problema principal-agente?

  • O problema principal-agente ocorre nos empréstimos devido a uma possibilidade positiva de que o principal não seja reembolsado.
  • O problema principal-agente pode ser resolvido ao escrever um contrato vinculante estipulando que o devedor se dedique totalmente.
  • Uma solução para o problema principal-agente nos empréstimos é que o devedor tenha que aportar seu próprio capital.
  • O problema principal-agente leva ao racionamento de crédito no mercado de empréstimos.
  • Ocorre um problema principal-agente nos empréstimos devido à assimetria de informação a respeito do esforço do devedor ou da qualidade do seu projeto.
  • O problema principal-agente existe porque não é possível assinar um contrato vinculativo garantindo dedicação total.
  • O aporte de capital próprio implica que o agente tem mais a perder se o projeto falhar, o que reduz a diferença de incentivos entre principal e agente.
  • Isso ocorre porque alguns projetos que de outro modo seriam viáveis não serão financiados devido ao problema principal-agente. Em especial, pessoas com poucos ativos ou pouca riqueza, que não podem aportar capital próprio no projeto ou oferecer garantias, terão maior probabilidade de sofrer restrições de crédito por causa do problema principal-agente.

Exercício 10.7 Microfinanciamento e empréstimo para os pobres

Leia o artigo ‘The Microfinance Promise’.10 O Banco Grameen, em Bangladesh, disponibiliza empréstimos para grupos de pessoas que se candidatam juntas a empréstimos individuais, sob a condição de que os empréstimos para os membros do grupo serão renovados no futuro se (e apenas se) cada membro pagar o empréstimo conforme programado.

Explique como tais arranjos afetariam a decisão dos devedores a respeito de como gastar o dinheiro, e quanto eles se esforçariam para assegurar que o pagamento seja possível.

10.13 Desigualdade: credores, tomadores e excluídos do mercado de crédito

Muito antes de existirem os empregadores, os empregados e os desempregados que estudamos no capítulo anterior, havia credores e devedores. Alguns dos primeiros registros históricos escritos são de dívidas. As diferenças de renda entre os que emprestam (pessoas como Marco) e os que pegam emprestado (pessoas como Júlia) permanecem sendo uma fonte importante de desigualdade econômica atual.

Podemos analisar as desigualdades entre devedores e credores (e entre os indivíduos que compõem a classe dos devedores) utilizando a mesma curva de Lorenz e o modelo de Coeficiente de Gini que usamos para estudar a desigualdade entre empregadores e empregados.

Podemos ilustrar assim: uma economia é composta por 90 agricultores que tomam empréstimos de 10 credores e usam os recursos para financiar o plantio e o cuidado com suas culturas. A colheita é vendida (em média) por uma quantia superior ao empréstimo tomado pelo agricultor, de modo que, para cada euro emprestado e investido, o agricultor recebe uma renda de 1 + Π, onde Π é chamado de taxa de lucro.

Após a colheita, os agricultores pagam os empréstimos com juros a uma taxa i. Vamos simplificar ao assumir que todos os empréstimos são pagos e que todos os credores emprestam a mesma quantia aos agricultores à mesma taxa de juros.

Como cada euro investido produz uma receita total de 1 + Π, cada agricultor produz renda (receita menos custos) de Π, mas essa é dividida entre o credor, que recebe uma renda de i para cada euro emprestado, e o devedor, que recebe o restante, Π − i. Portanto, o credor recebe uma parcela de i/Π da produção total, e o tomador recebe uma parcela de 1 − (i/Π).

Assim, se i = 0,10 e Π = 0,15, a parcela dos credores na renda total é de 2/3, e a dos devedores, de 1/3.

A desigualdade nesta economia está representada na Figura 10.21. O coeficiente de Gini é 0,57.

Nas seções anteriores, mostramos porque alguns possíveis devedores (aqueles que não têm garantias ou capital próprio para financiar um projeto) podem ser totalmente excluídos do acesso ao crédito mesmo que estejam dispostos a pagar a taxa de juros. Como isso afeta a curva de Lorenz e o coeficiente de Gini?

Para explorar esse caso, imagine que 40 dos potenciais tomadores sejam excluídos (e, como não podem tomar empréstimos, não recebem nenhuma renda) e que nada mais mude nessa situação (i e Π permanecem inalterados).

A linha pontilhada na Figura 10.21 representa a nova situação. O novo coeficiente de Gini é 0,70, o que mostra que a desigualdade aumentou como resultado da exclusão dos pobres do mercado de crédito.

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Figura 10.21 Desigualdade em uma economia de credores e tomadores de empréstimos. Nota: quando nenhum tomador é excluído, o coeficiente de Gini é de 0,57; quando 40 são excluídos, é de 0,70.

Um modelo de economia com credores e tomadores
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Um modelo de economia com credores e tomadores

Uma economia é composta por 90 fazendeiros que tomam empréstimos de 10 credores. Como i = 0,10 e Π = 0,15, a parcela dos credores na renda total é de 2/3, e a dos tomadores, de 1/3. O coeficiente de Gini é 0,57.

Alguns devedores são excluídos do mercado de crédito
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Alguns devedores são excluídos do mercado de crédito

Suponha que 40 dos potenciais tomadores sejam excluídos. Como não podem tomar empréstimos, não recebem nenhuma renda.

A desigualdade aumenta
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A desigualdade aumenta

Quando alguns potenciais tomadores são excluídos, o coeficiente de Gini aumenta para 0,70.

Questão 10.12 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Em uma economia com uma população de 100 habitantes, 80 são agricultores e 20 são credores. Os agricultores utilizam os recursos para financiar o plantio e o cuidado com suas culturas. A taxa de lucros para a colheita é de 12,5%, enquanto a taxa de juros cobrada é de 10%. Compare os dois casos a seguir:

  1. Caso A: todos os agricultores podem tomar empréstimos.
  2. Caso B: apenas 50 agricultores podem tomar empréstimos.

Com base nessas informações, qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • A parcela do produto total recebida pelos agricultores que podem tomar empréstimos é de 25%.
  • O coeficiente de Gini para o Caso A é 0,5.
  • O coeficiente de Gini para o Caso B é 0,6.
  • Há um aumento de 16,7% no coeficiente de Gini no Caso B em comparação com o Caso A.
  • Os agricultores recebem 12,5 – 10 = 2,5% dos 12,5% de taxa de lucro. Isso equivale a uma parcela de 2,5/12,5 = 20%.
  • O coeficiente de Gini para o Caso A é 0,6.
  • O coeficiente de Gini para o Caso B é 0,7.
  • 0,7 é 16,7% maior do que 0,6.

Esse exemplo ilustra o fato de que uma das causas de desigualdade em uma economia é que algumas pessoas (como Marco) estão em posição de lucrar ao emprestar dinheiro para outras, assim como outras pessoas (Bruno no Capítulo 5) estão em posição de lucrar ao empregarem outras.

Bruno e Marco provavelmente não são as pessoas mais queridas em suas respectivas economias. Por razões semelhantes, os bancos não são as instituições mais populares ou confiáveis. Nos Estados Unidos, por exemplo, 73% das pessoas demonstraram “muita” ou ”bastante” confiança nos militares em 2016, exatamente o mesmo nível de uma década antes. Por outro lado, no mesmo ano, apenas 27% demonstraram algum grau de confiança nos bancos, que estava em 49% uma década antes. Pesquisas mostram que o público na Alemanha, na Espanha e em muitos outros países têm pouca consideração pelos seus bancos, principalmente desde a crise financeira de 2008.

Dizem, às vezes, que pessoas ricas emprestam sob condições que as tornam ricas, enquanto as pobres pegam emprestado sob condições que as tornam pobres. Nosso exemplo de Júlia e Marco deixou claro que o ponto de vista de uma pessoa sobre a taxa de juros — vista como um custo para Júlia e uma fonte de renda para Marco — depende da riqueza de cada um. As pessoas com riqueza limitada têm restrições de crédito, o que limita sua capacidade de lucrar com oportunidades de investimento que estão abertas para aqueles com mais ativos.

Também é verdade que, ao estabelecer a taxa de juros à qual uma pessoa faz um empréstimo, o credor geralmente tem um poder de negociação superior e, logo, pode estabelecer uma taxa que lhe permita captar a maioria dos ganhos mútuos da transação.

Mas será que os bancos e o sistema financeiro tornam algumas pessoas ricas e outras pobres? Para responder a essa questão, compare os bancos a outras firmas maximizadoras de lucro. Ambos são propriedades de pessoas ricas, que lucram com os negócios com pessoas mais pobres. Além disso, essas transações são feitas em termos (taxas de juros, salários) que perpetuam a insuficiência de riqueza de devedores e empregados.

Exercício 10.8 Bancos impopulares

Por que os bancos tendem a ser mais impopulares do que outras firmas maximizadoras de lucro (Honda e Microsoft, por exemplo)?

Entretanto, nem mesmo as pessoas que não gostam dos bancos pensam que os menos ricos estariam em melhores condições sem os bancos, nem que os menos ricos se beneficiariam se as firmas parassem de empregar pessoas. Bancos, crédito e dinheiro são essenciais em uma economia moderna — inclusive para proporcionar oportunidades econômicas aos mais desfavorecidos, pois oferecem oportunidades de ganhos mútuos que ocorrem quando as pessoas podem obter benefícios ao transferir seu poder de compra de um período do tempo para outro, seja tomando empréstimos (trazendo-o para o presente) ou concedendo-os (o contrário).

Exercício 10.9 Limites na concessão de empréstimos

Muitos países têm políticas que limitam os juros que um credor pode cobrar por um empréstimo.

  1. Você acha que esses limites são uma boa ideia?
  2. Quem se beneficia e quem se prejudica com essas leis?
  3. Quais podem ser os efeitos dessas políticas no longo prazo?
  4. Compare essa forma de ajudar os mais pobres a terem acesso ao crédito com o Banco Grameen do Exercício 10.7.

10.14 Conclusão

Como mostrou o fechamento dos bancos irlandeses, dinheiro e crédito são tão fundamentais para as interações econômicas que as pessoas encontram maneiras de recriar o dinheiro mesmo quando as instituições formais falham nessa tarefa. Na verdade, os arqueólogos descobriram evidências do uso de dinheiro e empréstimos para denominar dívidas e facilitar trocas muito antes de existirem bancos ou governos. Isso se deve ao fato de ser possível obter ganhos mútuos substanciais quando um grupo de pessoas desenvolve confiança suficiente mútua, bem como em um meio de troca específico.

Nas economias modernas, a criação da moeda está indissociavelmente ligada à criação de crédito, ou ao processo de empréstimo por bancos comerciais, cujas ações são regulamentadas pelos governos e geridas pelo banco central. Tomar e conceder empréstimos permite que as pessoas suavizem o consumo quando têm rendas irregulares, que satisfaçam sua impaciência, ou que financiem investimentos que podem aumentar suas possibilidades de consumo futuro. O mercado de crédito produz ganhos mútuos para credores e tomadores de empréstimos mas, assim como muitas outras transações econômicas, a distribuição desses ganhos via taxa de juros representa um conflito de interesses.

Author query: Please provide definitions for “valor líquido”, “solvência”, “taxa de desconto”, “taxa de juros do banco central”, “oferta ampla de moeda” and “moeda escritural” or advise on which definitions in the glossary these should be linked to.

Conceitos introduzidos no Capítulo 10

Antes de seguir adiante, reveja essas definições:

10.15 Referências

  • Aleem, Irfan. 1990. ‘Imperfect information, screening, and the costs of informal lending: A study of a rural credit market in Pakistan’. The World Bank Economic Review 4 (3): pp. 329–349.
  • Bowles, Samuel. 2006. Microeconomics: Behavior, institutions, and evolution (the roundtable series in behavioral economics). Princeton, NJ: Princeton University Press.
  • Carlin, Wendy and David Soskice. 2015. Macroeconomics: Institutions, Instability, and the Financial System. Oxford: Oxford University Press. Chapters 5 and 6.
  • Graeber, David. 2012. ‘The Myth of Barter’. In Debt: The First 5,000 years. Brooklyn, NY: Melville House Publishing.
  • Gross, David, and Nicholas Souleles. 2002. ‘Do Liquidity Constraints and Interest Rates Matter for Consumer Behavior? Evidence from Credit Card Data’. The Quarterly Journal of Economics 117 (1) (February): pp. 149–185.
  • Martin, Felix. 2013. Money: The Unauthorised Biography. London: The Bodley Head.
  • Morduch, Jonathan. 1999. ‘The Microfinance Promise’. Journal of Economic Literature 37 (4) (December): pp. 1569–1614.
  • Murphy, Antoin E. 1978. ‘Money in an Economy Without Banks: The Case of Ireland’. The Manchester School 46 (1) (March): pp. 41–50.
  • Silver-Greenberg, Jessica. 2014. ‘New York Prosecutors Charge Payday Loan Firms with Usury’. DealBook.
  • Spaliara, Marina-Eliza. 2009. ‘Do Financial Factors Affect the Capital–labour Ratio? Evidence from UK Firm-level Data’. Journal of Banking & Finance 33 (10) (October): pp. 1932–1947.
  • The Economist. 2012. ‘The Fear Factor’. Updated 2 June 2012.
  1. Irfan Aleem. 1990. ‘Imperfect information, screening, and the costs of informal lending: A study of a rural credit market in Pakistan’. The World Bank Economic Review 4 (3): pp. 329–349. 

  2. Jessica Silver-Greenberg. 2014. ‘New York Prosecutors Charge Payday Loan Firms with Usury’. DealBook. 

  3. Felix Martin. 2013. Money: The Unauthorised Biography. London: The Bodley Head. 

  4. Antoin E. Murphy. 1978. ‘Money in an Economy without Banks: The Case of Ireland’. The Manchester School 46 (1) (March): pp. 41–50. 

  5. Jonathan Morduch. 1999. ‘The Microfinance Promise’. Journal of Economic Literature 37 (4) (December): pp. 1569–1614. 

  6. David Graeber. 2012. ‘The Myth of Barter’. Debt: The First 5,000 years. Brooklyn, NY: Melville House Publishing. 

  7. Adam Smith, ‘Of the Profits of Stock’. In An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations, 1776. 

  8. David Gross and Nicholas Souleles. 2002. ‘Do Liquidity Constraints and Interest Rates Matter for Consumer Behavior? Evidence from Credit Card Data’. The Quarterly Journal of Economics 117 (1) (February): pp. 149–185. 

  9. Samuel Bowles. 2006. Micro­economics: Behavior, Institutions, and Evolution (the Roundtable Series in Behavioral Economics). Princeton, NJ: Princeton University Press. 

  10. Jonathan Morduch. 1999. ‘The Microfinance Promise’. Journal of Economic Literature 37 (4) (December): pp. 1569–1614.